Quando falamos de redes sociais, não falamos apenas de “digital”. Falamos de uma indústria que molda cultura, entretenimento, economia e comportamento. Sei que isso parece repetitivo nesta coluna, mas quanto mais cedo eu entendi isso, mais cedo consegui obter resultados melhores e fora da curva com as contas de clientes da Cena7 (Agência de estratégia de conteúdo).
Na minha visão, a estratégia começa pelo “por que?“. Não pelo “onde?”, nem pelo “como?” e, às vezes, nem mesmo pelo tão importante “para quem?”. Se eu mudo o meu “por que?”, mudo minha visão, minha perspectiva e até a arquitetura da minha comunicação.
Faço essa introdução para chegar onde realmente importa: o propósito. Toda influência, digital ou não, deveria nascer dele. Propósitos são lindos, inspiradores até, mas sem uma base mercadológica por trás, permanecem apenas como palavras bonitas.
E é aí que chegamos ao ponto: estruturar uma indústria do zero não é simples, especialmente quando envolve arte.
O cinema, por exemplo, nasceu em 1895 como entretenimento de feira, algo episódico. Só se tornou indústria quando passou a ter produção em escala, distribuição organizada e exibição estruturada, consolidando-se em 1920, quando Hollywood entrou em cena.
A música seguiu um caminho parecido. Antes da indústria, era essencialmente ao vivo: concertos, igrejas, saraus. Não havia produto vendável nem mercado estruturado. Será que os músicos não ganhavam dinheiro? Tocavam em troca de permuta? Não sei ao certo. Mas só em 1950, com o rock’n’roll e o LP de vinil, a música virou produto cultural de massa, e as gravadoras, gigantes globais.
O rádio, como veículo, também precisou de tempo para se firmar. Segundo Lacos, em 1920 a publicidade sequer era autorizada, as rádios sobreviviam cobrando mensalidades de ouvintes. Somente em 1932, a propaganda foi liberada pelo governo, abrindo espaço para o modelo que conhecemos até hoje.
Agora, quero que você imagine a economia dos criadores de conteúdo no mesmo estágio: ainda em formação. É claro que o contexto é outro. Hoje temos o mundo nas mãos, a internet, que democratiza acesso à informação, mas, ao mesmo tempo, dificulta a fiscalização de boas práticas e a responsabilidade na veiculação dessas informações.
Segundo a Goldman Sachs, a creator economy pode chegar a meio trilhão de dólares em 2027. Para isso, precisamos de leis feitas por quem entende do mercado, contratos claros, plataformas transparentes, formação para criadores e capacitação para todos os players. Só assim deixaremos de ser vistos como uma “terra sem lei” e construiremos um mercado sólido.
Isso exige entender quem são os agentes (criadores, empresas, clientes, plataformas, concorrentes, reguladores), como se relacionam e quais são as regras do jogo (preço, distribuição por algoritmo, comunicação, barreiras de entrada). Exatamente como já aconteceu com o cinema, a música e o rádio.
Mas vivemos uma crise: no digital, tudo começa mais cedo. Crianças que ainda aprendem a escrever já dominam os stories, editam vídeos e seguem seus ídolos de perto. Muitas não apenas consomem, elas criam. E, ao criar, passam a influenciar, sem sequer compreender o peso disso.
Nesse cenário, incluir crianças e adolescentes em campanhas publicitárias exige cuidado redobrado. Não se trata apenas de alcance, curtidas ou performance de marca. Trata-se da formação de seres humanos em desenvolvimento. A Brunch, primeira agência de criadores parceira do Pacto Global da ONU, define três pilares da influência responsável:
- Transparência em campanhas publicitárias.
- Cumprimento das regras legais.
- Proteção de comunidades vulneráveis, como crianças e adolescentes.
Ignorar esses princípios gera riscos sérios: danos à reputação de marcas, exposição de criadores e perda de confiança das comunidades. Por isso, a agência lançou um Guia da Influência Responsável, reunindo as leis que orientam a comunicação digital, especialmente quando envolve menores de idade. Como reforça Ana Paula Passarelli, cofundadora da Brunch: “O que está em jogo não é apenas regulamentar uma profissão, mas estruturar uma indústria que impacta cultura, economia e sociedade.”
A pergunta é: estamos realmente entendendo a raiz do problema? Ou apenas tentando sobreviver à onda de informações que recebemos todos os dias, sem encarar de frente a necessidade de estruturação de uma indústria que já existe, já impacta e já transforma?
Passamos da fase do “são só influencers”. Estamos falando de formadores de opinião. Estamos falando de setores inteiros de marketing que renasceram nos últimos 10 anos, porque a configuração antiga já não dava conta do volume e da complexidade do mercado de influência. Profissionalizar a influência é proteger marcas, criadores e comunidades. Não é burocracia: é evolução. É o presente.