Publicitário formado pela ECA-USP, doutor e mestre em Ciências da Comunicação pelo PPGCOM-USP, professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba (Uniso) e dos cursos de publicidade da ECA-USP e da ESPM-SP. Sócio-fundador da Casa Semio.
O ensino da publicidade no Brasil, como se sabe, foi criado e institucionalizado nos anos 50 e 60 do século passado, para formar profissionais, de agência, seguindo aquela concepção (neo)liberal que, infelizmente, alcançou o sistema de ensino superior, fazendo dele uma mera máquina produtora de “autônomos”, relegando a pesquisa e mais ainda a extensão a planos desimportantes. Daí que, durante muito tempo, os “bons” professores de publicidade tenham sido os próprios publicitários, aqueles de vivência no “mercado”, capazes de levar (eu prefiro dizer trazer) para a sala de aula o conhecimento técnico e “real” da publicidade corrente.
Daí vieram os processos de expansão, industrialização, massificação (e desqualificação) dos cursos superiores e também as novas normas legais que passaram a exigir das instituições de ensino superior a formação acadêmica de seus professores. E, assim, os publicitários do “mercado” foram perdendo o interesse pelo ensino. De modo que, com isso, foi se criando um entendimento da formação em publicidade como que defasada, por não acompanhar pari passu as práticas do mercado, com a consequente valorização das pontuais presenças dos profissionais de mercado em âmbito acadêmico, em palestras, como convidados de aulas, participando das quase sempre mercadófilas “semanas de comunicação” etc.
Bobeou e a gente escuta a mesma coisa, seja aborrecidamente de um colega, lamentavelmente de um aluno ou agora revoltantemente das próprias empresas do “mercado”: é importante aproximar o mercado da academia. Sim, eu concordo e não por acaso, junto de alguns colegas queridos, trato de desentupir essa safena quase que diariamente. A questão é que me incomoda muito a visão que reside por detrás desse tipo de fala e conduta, que concebe a “academia” como algo estático, atrasado e desinformado, que precisa receber sangues e nutrientes do “mercado”, para então se fazer verdadeiramente capaz de formar os seus profissionais.
Bom, se a publicidade que temos hoje por aí fosse assim toda maravilhosa, inteligente, sofisticada, bem elaborada e, mais do que isso, responsável, solidária, cônscia de suas potências e de seus limites ou, olhando pelo outro lado, não fosse muitas vezes preconceituosa, elitista, perversa, cínica, oportunista e hipócrita – quando não simplesmente tosca, mal feita, sem graça, anticriativa e coalhada de lugares comuns e erros gramaticais –, eu até entenderia a necessidade de termos profissionais de “mercado” cantando de galo nas universidades, como generosos arautos dos rumos ideais da comunicação publicitária no país.
Mas como não é esse o caso, eu estou é esperando o dia em que, nas agências, vão fazer também uma “semana de comunicação”, chamando professores e pesquisadores em publicidade, para lhes contar também algumas novidades. Estou esperando o momento de estudiosos em publicidade serem chamados para dizer, nas empresas, o que a sociedade espera delas – da mesma forma que essas empresas ousadamente fazem, dizendo nas faculdades do país inteiro o que se espera dos egressos dos seus cursos de publicidade.
Vamos colocar as coisas no lugar. Nada contra, absolutamente nada, que profissionais de mercado circulem pela academia; é plenamente compreensível que, sobretudo em contextos mais afastados dos chamados grandes centros (econômicos, quer-se quase sempre dizer), a presença do “mercado” nas universidades represente de fato um importante componente técnico no desenvolvimento dos alunos; a formação de profissionais autônomos ou de mercado é uma realidade no sistema educacional, social, político e econômico brasileiro, o que implica inevitavelmente percursos formativos que privilegiem conteúdos técnicos e práticos (um dia precisamos falar mais sobre isso, sobre a falta que tem feito a formação teórica).
A questão que incomoda e que precisa ser consertada é o ponto de vista, o modo de se enxergar tudo isso. A ponte que liga o mercado e a academia é larga, pode e precisa ser ampliada, por ela devemos cada vez mais transitar – mas sem jamais esquecer um detalhe: ela tem que ser de mão dupla.
Bruno Pompeu