Balenciaga: vem aí um novo capítulo

Por Redação

10/01/2024 11h38

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Balenciaga, você já ouviu esse nome quantas vezes nos últimos meses? Independente de ser um consumidor de luxo ou acompanhar as principais semanas de moda do mundo, essa marca não deve ter passado desapercebida até mesmo para aqueles que não seguem as tendências da moda, uma vez que a mesma está sempre em evidência nos meios de comunicação e, principalmente, nas redes sociais. As polêmicas são constantes, envolvendo produtos caríssimos e, muitas vezes, esquisitos, até chegar no ponto de ser boicotada por famosos e fashionistas.

Em 2024, o nome Balenciaga estará em evidência, novamente (não é uma previsão de ano novo)!!!! O motivo? Está previsto para o dia 19 de janeiro, em plataforma streaming, o lançamento da série biográfica do fundador da grife de luxo, que promete contar sobre a fundação da marca, além de detalhes da vida pessoal do costureiro. Cristóbal Balenciaga, costureiro e fundador da marca tinha personalidade forte, era avesso aos refletores, à mídia e à publicidade, primava pelo perfeccionismo, senso de proporção e equilíbrio em suas criações e dizia que “As mulheres não tinham de ser perfeitas ou mesmo bonitas para usar suas roupas. As roupas as tornavam bonitas”. 

O país onde nasceu, a Espanha, era a grande referência no estilo de Balenciaga, que trazia elementos do flamenco e das touradas em suas criações, sendo que um de seus vestidos de baile mais famosos, Infanta, é uma homenagem ao quadro “As Meninas”, de Velásquez. Cristóbal é conhecido, até os dias atuais, como um grande mestre da alta costura, sendo um dos poucos estilistas que desenhava e possuía a prática da modelagem. As peças concebidas por ele não demandavam o uso de roupas íntimas, pois modelavam o corpo feminino através de sua estrutura e do uso de tecidos de excelente qualidade. 

Balenciaga tinha como propósito deixar a mulher que usasse suas criações elegante e sofisticada, não aceitava exigências de suas clientes, entre elas membros da família real espanhola e da alta corte, pois buscava sempre a perfeição, através de suas refinadas técnicas de corte e costura. A influência de seu estilo é percebida nas coleções de nomes tais como Giorgio Armani, Calvin Klein, John Galliano, Gianfranco Ferré, Alexander McQueen, Marcelo Sommer, além de toda uma nova geração que ainda o considera “o arquiteto da alta costura”, como a ele se referia Givenchy. 

A partir da década de 1960, o segmento de alta costura iniciou uma fase de declínio, surgindo o prêt-à-porter, ou seja, roupas prontas para o uso, vendidas em lojas de departamento e com preços mais acessíveis à massa consumidora. Balenciaga não aceitava esse novo sistema de confecção, se aposentou em 1968, fechando suas casas em Paris e na Espanha. No ano de 1972, faleceu. 

Somente em 1986, os direitos da marca foram adquiridos por Jacques Bogart, que geriu uma nova construção marcária, introduzindo, inclusive, uma linha de prêt-à-porter. No ano de 1997, Nicholas Ghesquière, assumiu a direção criativa da Maison Balenciaga, tornando-a um sucesso novamente. No ano de 2001, a Balenciaga foi adquirida por um dos maiores conglomerados do mercado de luxo, o grupo Kering, que também possui marcas tais como Gucci e Bottega Veneta. A partir de então, a Balenciaga voltou a reconstruir sua história, Alexander Wang assumiu a função de diretor criativo, cargo este que passou a ser exercido por Demna Gvasalia, principal nome envolvido nas polêmicas da Balenciaga. 

O mercado contemporâneo de moda luta por maior inclusão, sustentabilidade e responsabilidade social, fazendo com que marcas e diretores criativos reforcem suas mensagens com esses pilares. Contudo, tais práticas não foram observadas pela Balenciaga ao veicular a campanha publicitária, primavera/verão, 2023, que sexualiza crianças.  A comunicação da marca ultrapassou os limites da polêmica e se configurou como agressiva, criminosa e pornográfica. As imagens utilizadas mostravam menores em um cenário com elementos relacionados à prática BDSM (bondage, disciplina, dominação, submissão, sadismo e masoquismo), havia velas, bebidas alcóolicas, algemas, coleiras e outros objetos totalmente distantes do universo infantil. O nome Balenciaga foi exposto de uma maneira totalmente negativa, sendo que a marca sofreu backlash, ou seja, retaliação, por celebridades, consumidores e pela mídia em geral. 

Características intrínsecas ao entendimento do conceito de luxo, como raridade, exclusividade e opulência encontram ancoragem em um mercado constituído por consumidores maduros, bem-sucedidos e que optam por grifes caras como forma de exaltar sua personalidade e condição financeira. Contudo, é necessário entender os rituais de consumo da persona que aceita pagar caro por um par de tênis desconstruído, bolsas em forma de pombos ou sacos de lixo, dentre outros produtos polêmicos, lançados pela marca, durante a direção criativa de Demna Gvasalia. 

Em um mercado cada vez mais acirrado pela conquista de consumidores, os produtos poucos se distinguem uns dos outros, fazendo com que as organizações se preocupem com a imagem e a construção de marcas mito. Os artigos ofertados se estabelecem em esferas funcionais, cabendo à marca explorar o aspecto simbólico. Além disso, as grifes de luxo devem mostrar-se modernas, engajadas e sedutoras para conquistar um novo público-alvo mais jovem e ativo nas mídias sociais.

A pergunta a se fazer é: será que a série será capaz de desvencilhar os impactos negativos, vinculados à marca Balenciaga, e recuperar a glória e o prestígio de sua origem? Aguardemos!

Sobre a autora:
Carolina Boari

Pós Doutora em Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/SP). Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Atua como docente em cursos de Comunicação, Marketing e Moda. Pesquisadora do mercado de luxo

Coluna com curadoria de:

Clotilde Perez
Professora universitária, pesquisadora e consultora
Clotilde Perez é professora universitária, pesquisadora, consultora e colunista brasileira, titular de semiótica e publicidade da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo, concentrando seus estudos nas áreas da semiótica, comunicação, consumo e sociedade contemporânea. Fundadora da Casa Semio, primeiro e único instituto de pesquisa de mercado voltado à semiótica no Brasil, já tendo prestado consultoria nessa área para grandes empresas nacionais e internacionais, conjugando o pensamento científico às práticas de mercado. Apresenta palestras e seminários no Brasil e no mundo sobre semiótica, suas aplicações no mercado e diversos recortes temáticos em uma perspectiva latino-americana e brasileira em diálogo com os grandes movimentos globais.