Fãs de esportes – e novos críticos de moda – de olho em Paris

Por Redação

04/09/2024 10h04

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Pouco mais de um mês após a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos em Paris – e agora em meio aos Jogos Paralímpicos – seguimos impactados pelo esporte em profunda conexão com a moda. Talvez essa edição em Paris, por tudo o que a cidade naturalmente representa, tenha sido a que mais repercutiu as roupas, os looks, os kits de produtos recebidos e usados pelos atletas dentro e fora das arenas olímpicas.

Ao mesmo tempo, Paris 2024 foi a edição mais conectada da história, e os bilhões de views no TikTok, YouTube, Instagram, quantificam uma cobertura plural de conteúdo onde o esporte transbordou para outros territórios e criou novas narrativas tão quentes quanto os resultados das competições. O atleta que publica um vídeo unboxing e desfila com as roupas novas é o mesmo que sobe ao pódio para receber a medalha. O fã de esportes, especialista em todas as modalidades de 4 em 4 anos, é o novo crítico de moda.

A verdade é que, como parte essencial da nossa cultura, o esporte e a moda sempre foram inseparáveis, e as grandes marcas vêm trabalhando estrategicamente nisso há décadas; mas a ocasião das Olimpíadas hiperconectadas em Paris intensificou a “audiência fiscal” pelo que é bonito/feio, tendência/ultrapassado, representativo/desconexo; e que sequer as próprias marcas estavam preparadas para tamanha repercussão. No Brasil, os inúmeros vídeos que comparavam o uniforme da abertura e a sacola sustentável dos nossos atletas com as malas enormes cheias de produtos recebidos por delegações estrangeiras, foram a ilustração perfeita de uma audiência crítica-produtora, que cria, edita, publica e viraliza histórias que podem mudar o rumo das marcas antes mesmo das competições começarem.

Vale lembrar que para as marcas de moda esportiva/casual, as Olimpíadas representam uma plataforma confusa de ativação, seja pela salada de patrocinadores que um mesmo país/atleta está exposto ou pela limitação imposta pelo próprio Comitê Olímpico Internacional. Na maioria dos casos, a marca que veste na cerimônia de abertura não é a mesma que veste nas competições, e que também não é a mesma que veste no momento do pódio. São estilos muito diferentes para representar um mesmo país e vestir as mesmas pessoas em um prazo tão curto de tempo. Independente disso, para o consumidor, se uma marca tem o espaço de criar peças para vestir alguém – que representa um país – ela obrigatoriamente precisa fazer bem feito (e bonito). É uma ação que impacta no esporte, na moda, e também na política.

O consumidor espera das marcas nas Olimpíadas um papel de projeção de imagem positiva do país diante do mundo que nenhuma outra instituição consegue entregar naquele momento.  Parafraseando Nestor Garcia Canclini, o consumo é um ato de cidadania, e nas Olimpíadas este consumo ativo, fiscal, traz uma perspectiva cidadã de cobrança sobre o que o atleta/país merece receber no ápice de sua visibilidade.

Para Los Angeles 2028, espera-se Olimpíadas ainda mais potentes – e midiáticas – sobre as intersecções do esporte com outros territórios culturais, uma vez que a moda norte-americana está historicamente conectada aos movimentos da música. Isso também ficou evidente nos teasers que foram apresentados na cerimônia de enceramento em Paris, com Snoop Dogg e Billie Eilish.

Por fim, é importante destacar que os aprendizados sobre uma “audiência cada vez mais fiscal” nas Olimpíadas, que têm expectativas altas nas marcas para além do esporte, é o ponto de partida para que essas mesmas marcas reflitam sobre os inúmeros significados que elas comunicam quando produzem peças de roupas ou peças publicitárias. As Olimpíadas, como principal momento de celebração à cultura pelo esporte, são uma fonte rica e inesgotável para as marcas criarem, mas também podem ser um poço perigoso para os desavisados.

Sobre Maurício Faria:

Gerente de Culture Marketing na Adidas do Brasil; Mestre e Doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP; integrante do Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo (GESC3) da ECA-USP.

Clotilde Perez
Professora universitária, pesquisadora e consultora
Clotilde Perez é professora universitária, pesquisadora, consultora e colunista brasileira, titular de semiótica e publicidade da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo, concentrando seus estudos nas áreas da semiótica, comunicação, consumo e sociedade contemporânea. Fundadora da Casa Semio, primeiro e único instituto de pesquisa de mercado voltado à semiótica no Brasil, já tendo prestado consultoria nessa área para grandes empresas nacionais e internacionais, conjugando o pensamento científico às práticas de mercado. Apresenta palestras e seminários no Brasil e no mundo sobre semiótica, suas aplicações no mercado e diversos recortes temáticos em uma perspectiva latino-americana e brasileira em diálogo com os grandes movimentos globais.