Artigo
É comum associar à atividade publicitária uma imagem de informalidade. Essa mesma associação do fazer publicitário se transfere aos profissionais do campo, que são identificados, na maior parte das vezes, como descolados, alternativos, descontraídos, confundindo o que possa ser flexibilidade e adaptabilidade com informalidade. E essa é uma distinção essencial.
Sim, esse é um campo que se acostumou a estar sempre em condição de adaptação, e com muita agilidade. Muito mais que outros setores e ambientes profissionais, porque nele habitam múltiplas motivações como as econômicas, mercadológicas, tecnológicas, sociais, culturais, comunicacionais e comportamentais. E, tudo isso, ao mesmo tempo. Mudam as tecnologias, muda a lógica de consumo, muda o comportamento de compra, muda a linguagem, mudam os meios, muda o acesso, mudam os modelos de comércio, muda a economia e tudo circula, sem parar. Não é à toa que este é um dos ambientes em que mais acontece a autêntica inovação. Porque é necessário. Porque é uma condição de sobrevivência.
Nessa lógica, também os modelos e formatos de trabalho vem sendo constantemente transformados e testados. Claro, isso não é condição exclusiva da atividade publicitária, mas nessa área esse tipo de experiência e busca por inovação é muito recorrente. Até porque, a parte da imagem tão descontraída e leve que o ambiente profissional sempre projetou, sabemos que ainda resistem modelos bastante hierarquizados. Em busca de outros modos de trabalho, muita inovação já aconteceu nas empresas que atuam com publicidade. Como exemplo há as empresas sem sede física; os ecossistemas de empresas, modelados em formato celular, com vários tipos de negócio dentro da própria estrutura; e as plataformas que conectam clientes a parceiros de comunicação a partir de uma lógica uberizada.
Em 2020, um novo fator entrou em cena: a pandemia mundial. Com ela, veio também o distanciamento social e inúmeras formas novas de entregar conteúdo e serviço. Para muitas empresas isso acelerou a adoção do trabalho remoto, como também trouxe a necessidade de adequação da legislação. E trouxe também novos conceitos e significados para a atividade profissional: mais do que um working from home, muitos afirmam que estamos vivendo atualmente a experiência do working from anywhere. Neste modelo, o que mais interessa são os talentos, habilidades e competências, permitindo que a atuação seja/esteja em qualquer lugar do mundo. Os publicitários, que já experimentavam estas modalidades em alguma medida, viram esses modelos ampliar exponencialmente.
No período de um ano, crescemos e aprendemos muito com os novos formatos de trabalho. Os especialistas de recursos humanos afirmam, com segurança, que o trabalho não será mais o mesmo após a pandemia. Não há dúvida. No entanto, as legislações trabalhista e tributária ainda não estão preparadas para que seja um processo simples e rápido. Muitas questões ainda merecem especial atenção como a precarização do trabalho, as longas jornadas, a não remuneração da hora extra, os benefícios e os danos de ser um freelancer, entre outras tantas antigas preocupações deste campo profissional tão aberto e flexível aos ajustes e mudanças. Por isso, é importante retomar a diferença necessária entre informalidade e flexibilidade/adaptabilidade no trabalho publicitário. Ser uma atividade flexível e adaptável é uma condição necessária. Mas ser informal, não é. Que possamos seguir questionando e acompanhando de perto todas estas transformações.
Cristiane Mafacioli Carvalho
Graduada Publicidade e Propaganda pela PUCRS, mestre em Comunicação pela UFRJ e doutora em Ciências da Comunicação pela Unisinos. Atualmente é decana da Escola de Comunicação, Artes e Design da PUCRS, onde atua como professora na Graduação de Publicidade e Propaganda e também no Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Publicidade e Propaganda, atuando principalmente nos seguintes temas: discurso das mídias; discurso publicitário; inovação na prática publicitária.