Professora universitária, pesquisadora, consultora e colunista brasileira, titular de semiótica e publicidade da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo, concentrando seus estudos nas áreas da semiótica, comunicação, consumo e sociedade contemporânea.
Dois caminhos justificam a criação de um “dia de…”. Para celebrar, com o sentido de repetição para marcar a importância de um acontecimento, referência ou personagem, ou para chamar a atenção para o que ainda falta e é urgente conquistar, ou seja, para ampliar a informação, sensibilizar e transformar. Nesse segundo eixo é que se encaixa o Dia Internacional das Mulheres.
Clara Josephine Zetkin (1857-1933), professora, jornalista alemã, comunista e defensora dos direitos das mulheres, foi quem sugeriu, durante a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, realizada da Folket Hus, Casa do Povo, em Copenhagen, a criação do Dia Internacional das Mulheres, em 1910. Foi celebrado pela primeira vez em 1911, na Áustria, Dinamarca, Alemanha e Suíça, e só instituído pela ONU em 1975. Em 2010 foi criada a ONU Mulheres com o objetivo de fortalecer e ampliar os esforços mundiais em defesa dos direitos humanos das mulheres, seguindo a trajetória de ações de duas décadas do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM) em defesa das mulheres, por meio do apoio aos movimentos de mulheres e feministas (https://www.onumulheres.org.br/).
A data 08 de março foi escolhida como referência a uma greve de mulheres ocorrida na Rússia em 1917, no meio da I Guerra, cujo lema era “pão e paz”, movidas pela necessidade de mudanças nas péssimas condições de trabalho, pela fome e pela guerra. Essas mulheres reunidas em São Petersburgo conseguiram derrubar o então czar Nicolau II, tendo como consequência a instauração da Revolução Russa, com a posterior conquista do direito ao voto no país, instituído pelo governo provisório e outros direitos como divórcio e creches para os filhos. No Brasil, o direito ao voto das mulheres só foi concedido em 1932. Ainda que o país pudesse ter sido o primeiro a aprovar o voto das mulheres, porque foi em 1º de janeiro de 1891, que 31 mulheres constituintes assinaram uma emenda ao projeto da nossa Constituição que previa o direito de voto à mulher. Tal emenda foi rejeitada, porque a simples ideia de mulheres atuando na esfera pública não era admissível para as mentalidades retrógradas e machistas da época. Perdemos a oportunidade do protagonismo no caminho da igualdade de gêneros.
No dia 8 de março, somos tomados por manifestações estéticas variadas que buscam consolidar significados e inspirar mudanças. Uma dessas expressões é a cor roxa, que é a cor-símbolo do Dia Internacional das Mulheres, mistura do vermelho com o azul, que carrega os significados de justiça e dignidade (site oficial), unindo as perspectivas culturais que associam liberdade com a cor azul e o vermelho da fraternidade. Ainda que as cores branca (para destacar das cores escuras dos homens) e verde (esperança dos movimentos feministas) também sejam mencionadas, a cor roxa é o emblema internacional. Conectada com os sentidos de profundidade, dignidade, permanência, realeza, mistério, fantasia e espiritualidade, a cor expressa a nobreza e a coragem das mulheres. As sufragistas inglesas e americanas já utilizam a cor roxa como signo identitário e expressivo em roupas, calçados e materiais promocionais do movimento.
Atualmente, a cor, em suas diversas tonalidades e nomes, roxo, violeta, púrpura, lilás…, é signo do feminino contemporâneo, rompendo com a fixação da cor rosa do feminino clássico, carregado de estereótipos e polarizações com a cor azul, dos homens. O processo de crescimento dos significados, próprio de todo signo, traz mobilidade, complexidade e adensamento às significações, assim também ocorre com as cores. No caso do signo cromático roxo, todas as conexões do passado e do presente são muito aderentes ao ser mulher nas suas potencialidades, conquistas e lutas.
Para este ano o lema do Dia Internacional das Mulheres é “Por um mundo inclusivo: inovação e tecnologia para a igualdade de gênero”. Expressa um objetivo, a inclusão e a igualdade de gênero como ideal universal e dá um caminho, a inovação e a tecnologia. Objetivo e processo apontam para os resultados possíveis. Em uma sociedade ainda muito desigual, discriminatória e insegura para as mulheres, com altas taxas de violências plurais e feminicídio, um crime evitável, o Dia Internacional das Mulheres vem recoberto de conscientização sobre conquistas e evidências do que ainda falta por atingir, mas também de inspiração para seguir na transformação social, no caminho da equidade e do bem comum, tão esquecido em tempos de exacerbação dos individualismos e negacionismos.
Clotilde Perez