Etarismo no Brasil: uma realidade que envergonha

Por Redação

04/07/2023 14h10

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Elza Soares, intérprete da música brasileira com premiações internacionais morreu aos 92 anos de idade. Rita Lee, cantora e compositora brasileira ícone de uma geração, morreu aos 74 anos. Tina Turner, popstar mundialmente conhecida, morreu aos 83. Antônio Ermínio Moraes, industrial brasileiro de grande relevância no cenário empresarial, morreu aos 86. Todas essas pessoas tiveram a sorte de estarem na ativa e no comando de suas vidas e carreiras com notoriedade, sucesso e inteligência. E as centenas de anônimos com mais de 60 anos que não tiveram a mesma sorte?  

No sul do Japão existe uma ilha denominada Okinawa onde concentram-se o maior número de pessoas com mais de 100 anos em pleno vigor, (e por esse motivo esse lugar é conhecido como a “terra dos imortais)”. Aliás, o Japão está entre os países com maior expectativa de vida. Em 2020 o número de centenários chegou a 86.510 pessoas (segundo um artigo de época negócios de outubro 2021). Outras localidades, como Sardenha, (Itália), Loma Linda, (Estados Unidos), Península de Nicoya, (Costa Rica) e Icária (Grécia) são conhecidos por seus habitantes de mais de 60 anos serem pessoas que trabalham, pagam suas contas, se divertem, participam da sociedade e vivem bem.

Segundo projeções da Organização Mundial da Saúde (OMS) o mundo terá 1.4 bilhão de habitantes com mais de 60 anos em 2030. O Brasil terá cerca de 90 milhões de pessoas nesta faixa etária em 2050. Atualmente somos 33 milhões, (que em sua maioria vivem à margem da sociedade). Se considerarmos por exemplo as classes sociais menos favorecidas, falta quase tudo para que essa geração possa ter dignidade, respeito, atenção e consideração. O nosso país dentre outras carências, definitivamente não sabe conviver e valorizar os idosos. Seja por falta de políticas públicas de qualidade e honestas (em propostas e em entregas), seja por preconceito absurdo, idiota e maldoso e em diversos casos pelas populações mais novas que esquecem que com sorte, viverão bastante para um dia também alcançar a terceira idade. 

Mais afinal o que é ser velho? O principal causador do envelhecimento humano está dentro das nossas células. Em seu constante processo de divisão, pequenos fragmentos de DNA podem se perder. Fora isto, se tivermos saúde, autonomia, liberdade financeira e alegria de viver, ser velho é sobre como percebemos a nós mesmos, ou sobre como os outros nos percebem. De fato, o cotidiano urbano tem nos ensinado que as pessoas adoram rotular os “idosos” com incapazes. Eles são o fardo pesado da sociedade, os que tem limitações, os que precisam sobreviver às custas de programas e serviços sociais. São os mais fracos, os vulneráveis e os que não tem mais valor. São por diversas vezes, os esquecidos e os que os outros não tem a mínima paciência de ouvir. 

A realidade é que o preconceito é verdadeiro. E isso tem nome: etarismo – (também conhecido como ageismo ou idadismo). Em outras palavras: é qualquer forma de preconceito, discriminação ou estereótipo que surge devido à idade de uma pessoa. As atitudes preconceituosas podem acontecer de maneira individual ou por meio de políticas e práticas organizacionais. E essa visão depreciativa sobre a senioridade não é recente. Podemos dizer que pós a Revolução Industrial, construiu-se a compreensão de que as pessoas idosas eram “inúteis” para o sistema econômico e social. E partir daí, construiu-se a interpretação de que representavam um fardo para a sociedade.  

As mulheres são as que mais sofrem com essa forma de preconceito (e não poderia ser diferente não é mesmo?) Em muitos âmbitos, a mulher com mais idade é invalidada e considerada incapaz. Sofre discriminação na hora de buscar novas oportunidades profissionais e aquelas acima de 40 anos de idade sentem o peso da desigualdade etária. De maneira geral, uma pesquisa realizada no Brasil em 2022 pela Consultoria Hype50, profissionais acima de 55 anos confessaram que se sentem excluídos ou descartados do mercado de trabalho. Além disso, sofrem comentários e insultos relacionados a idade, tais como: “Você deveria se aposentar; você não serve para essa vaga; precisamos de sangue novo ou não existe um plano de carreia ou crescimento para você”. 

Na prática como uma mulher de 52 anos que sou, e vivendo diariamente os desafios do mundo corporativo sei perfeitamente como as coisas são. Eu presencio em muitas empresas pretextos usados para demissões de funcionários com mais de 40 anos de idade (imaginem para além do 50). O discurso muitas vezes está alicerçado na inovação, tecnologia e nas metodologias ágeis que quase sempre é muito mais “um discurso corporativo do que uma realidade presenciada e existente”.

Mas felizmente, há organizações que não pautam por essas perspectivas. De acordo com um estudo da Deloitte, de 2021 e com 215 empresas brasileiras , mostra que 37% das empresas entrevistadas criaram um grupo de afinidade para profissionais maiores de 50 anos, 20% disseram que as práticas contra o etarismo estão avançando, e 34% revelaram que pretendem adotá-la nos próximos anos. E isso é uma linda canção para os nossos ouvidos. Pois quem sofre esse tipo de discriminação perde em saúde física e mental. Isolamento, solidão, depressão, insegurança financeira, redução da qualidade de vida e até mesmo morte prematura (acreditem, é sério). Para combater o etarismo em todas as esferas da sociedade, o Governo Federal do Brasil, aprovou em 2003 lei n0 10.741, conhecida como o estatuto do idoso. Essa legislação lançou a base para que as pessoas mais maduras tenham os seus direitos respeitados. No capítulo 6 desta lei, o estatuto foca no ambiente corporativo. Entre as garantias, está o exercício de atividade profissional, respeitando as condições físicas, psíquicas e intelectuais. Além disso, proíbe a discriminação e a fixação de limite máximo de idade nas empresas — salvo por exigência do cargo.

Assim como os mais novos precisam ser absorvidos pelas empresas, os mais experientes, atualizados e em plena capacidade intelectual precisa ser mantido e valorizado. Estamos vivendo o tempo que a soma de experiencias irá fazer a diferença dentro das organizações. É preciso equilíbrio. É preciso entender que velho mesmo é o preconceito.  

Simone Moura é formada em comunicação social, especialista em branding, comportamento de consumo e neuromarketing, é mestre em Comunicação e Novas tecnologias e doutoranda na mesma área. Com 28 anos de atuação profissional já contribuiu para vários players de diversos segmentos como indústria, varejo e publicidade e propaganda. Vasta experiência em planejamento estratégico de comunicação com foco em propósito, reposicionamento de mercado e gestão de branding. É embaixatriz da Ikigai Brasil e CEO da Ping Pong Estratégia.

Simone Moura
Consultora e CEO da Ping Pong
Simone Moura é formada em comunicação social, especialista em branding, MBA´s nas áreas de marketing, comportamento de consumo e neuro marketing, e cursos de especialização na Universidade de Harvard em disrupção e teorias Jobs to be done. Mestre em Comunicação e novas tecnologias pela Universidade do Minho, Portugal. Possui 30 anos de atuação profissional e já contribuiu para vários players de diversos segmentos como indústria, varejo, serviços e publicidade e propaganda. Simone tem vasta experiência em planejamento estratégico de comunicação com foco em propósito, posicionamento de mercado e gestão de branding. É embaixatriz da Ikigai Brasi. Fundou a Ping Pong Estratégia em 2010 e atua em todo o Brasil.