Muito se fala em liderança de alta performance. É o tema da vez em qualquer palco corporativo. Mas a verdade é simples: ninguém transforma mercados sussurrando. Nenhuma empresa sustenta performance calando a própria gente. Stephen R. Covey chamou de oitavo hábito o salto da eficácia para a grandeza: encontrar a própria voz e inspirar outros a encontrarem a deles — não como discurso motivacional, mas como método para criar valor em escala. Quando a organização autoriza a voz, o trabalho deixa de ser tarefa e vira construção de significado.
Voz, aqui, não é opinião em volume nem licença para retórica vazia. É a convergência entre talento (o que você faz bem), paixão (o que ama fazer), necessidade (onde dói para o cliente) e consciência (o crivo ético da contribuição). Essa síntese, tantas vezes abafada por medo ou burocracia, é o coração da inovação. Empresas que vendem silêncio interno compram mediocridade externa. As que cultivam voz colhem diferenciação, aprendizado veloz e lealdade — do time e do mercado.
Mas voz sem clareza vira ruído. Criatividade sem direção é barulho inteligente. Toda equipe precisa dominar três claridades estratégicas: de sentido (porque isso importa), de jogo (o que entregar) e de arena (como decidir). Quando líderes unem voz e clareza, nasce a proatividade que antecipa, ajusta e melhora. Quando não, instala-se a paralisia: gente talentosa esperando autorização para pensar.
Isso exige liderança que lidera — não que chefia. O velho command & control gasta energia controlando pessoas; o modelo Trust & Inspire parte da confiança: pessoas são criativas, colaborativas e cheias de potencial. Confiar e inspirar não é romantismo, é engenharia de performance. Resulta em decisões mais próximas do cliente, ciclos curtos de aprendizado e comprometimento genuíno — o tipo que bônus nenhum compra.
Há também uma virada antropológica. Covey defendia o paradigma da pessoa inteira: inteligência mental (clareza), física (execução), emocional (pertencimento) e espiritual (sentido). Quando a estratégia ignora uma dessas dimensões, o preço é desengajamento e cinismo. Negócios que desenham processos e metas para a pessoa inteira constroem antifragilidade cultural.
Por que, então, ainda é raro? Porque dar voz expõe inseguranças hierárquicas, exige transparência e curadoria ativa de conflitos criativos. Conflito não é falha; é matéria-prima da sinergia. E sinergia não nasce de discurso, mas de estrutura: reuniões com propósito, indicadores que medem aprendizado, P&D de ideias, post-mortem sem caça às bruxas, e canais de feedback onde contribuições viram decisões reais. Cultura é o que a liderança tolera e recompensa. Se você premia obediência, não espere coragem — justamente o ingrediente que poderia salvar um cliente ou um projeto.
Se sua empresa quer criatividade e proatividade, precisa redistribuir o microfone. Isso começa com perguntas que desinstalam o senso comum: o que assumimos como verdade que já não é? Que processo herdamos e não precisamos mais? O que nos impede de cumprir o que prometemos ao cliente? Voz também é método: quadros simples de problemas e apostas, decisões documentadas com racional e contra racional, e rituais de aprendizagem que transformam erros e acertos em capital vivo.
“Mas e se falarem demais?” — perguntam os céticos. Falar demais sem agir é sintoma de falta de clareza ou ausência de dono. Dê projeto, mandato e prazo. Autonomia sem contexto é abandono; com contexto, é aceleração. Quem tem voz e clareza entrega com autoria — e autoria é o antídoto do “cumprir tabela”. É também o berço da responsabilidade: quem participa do desenho assume o resultado.
Não confunda voz com barulho sindical, nem confiança com ingenuidade. O modelo Trust & Inspire é exigente: alinha expectativas, mede com nitidez, devolve feedback duro quando necessário e protege o mérito sem humilhar ninguém. Líderes assim praticam três movimentos: visão que convoca (norte claro, não slogans), escuta que metaboliza (contribuições viram decisão) e coragem que arbitra (prioriza, corta, banca). O resto é ruído disfarçado de gestão.
Voz não se pede; constrói-se. Constrói-se investindo em repertório (formação contínua), linguagem comum (vocabulário e frameworks), segurança psicológica (ninguém ridicularizado por errar) e rituais públicos de mérito (celebrar aprendizados, não apenas metas). E preserva-se quando a liderança evita as cinco doenças que apodrecem culturas: criticar por vício, comparar por inveja, competir por vaidade, contender por poder e reclamar para fugir da responsabilidade. Tudo isso drena a energia que deveria estar na luta certa — a do mercado.
No fim, a equação é simples e implacável: voz + clareza + confiança = desempenho composto. Sem voz, desperdiçamos potencial. Sem clareza, desperdiçamos tempo. Sem confiança, desperdiçamos gente.
E o custo oculto desse desperdício é o futuro que deixamos de construir. Antes de desenhar o próximo OKR, faça a pergunta que separa empresas morosas de marcas memoráveis: quem aqui tem voz — e quem ainda precisa de permissão para usá-la? A resposta revelará a distância entre sua eficácia e a grandeza que você promete.
Vivemos a era em que a inteligência artificial aprende sozinha — e nós, paradoxalmente, desaprendemos a sentir. Alvin Toffler, futurista norte-americano, já previa em A Terceira Onda (1980) que o mundo abandonaria a sociedade industrial para mergulhar na era da informação — uma transição que redefiniria o trabalho, a economia e a própria condição humana. Pois bem: essa onda já passou. Agora, quem não evoluir em humanidade corre o risco de se tornar obsoleto antes das máquinas. Ser humano é o novo upgrade. É o que nos protege dos hiatos da pressa, dos conflitos do ego e da perda silenciosa de talentos que poderiam ter transformado o futuro.
Cuidem-se e até breve.
REFERÊNCIAS:
COVEY, STEPHEN R. O 8º Hábito: da Eficácia à Grandeza. Editora Elsevier, 2025.
