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Daniela Diniz, do GPTW, dialoga sobre os desafios e prioridades dos ambientes de gestão das empresas cearenses

Por Lucas Abreu

16/04/2025 17h09

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Saúde mental e comunicação interna foram apontadas como as questões mais importantes e desafiadoras para 2025

No início de abril, a filial brasileira da consultoria global Great Place To Work divulgou sua pesquisa Tendência de Gestão de Pessoas 2025. Realizada entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, o exame contou com a colaboração 2134 respondentes de diversos estados do Brasil e de organizações dos mais variados setores, sendo Tecnologia e Telecomunicações, Indústria e Serviços os mais alcançados.

O estado do Ceará ficou em nono lugar no ranking de estados que tiveram maior participação. Ao todo, 63 profissionais responderam ao questionário, expondo quais são suas percepções sobre o cenário de 2025 em tópicos diversos como saúde mental, modelo de trabalho, ESG, diversidade e inclusão, desenvolvimento de pessoas, inovação e tecnologia.

Para contextualizar os dados disponibilizados na pesquisa Tendência de Gestão de Pessoas 2025 e aprofundar as discussões sobre as prioridades e desafios enfrentados pelos profissionais alocados no Ceará, o Nosso Meio conversou com Daniela Diniz, diretora de conteúdo e relações institucionais no Ecossistema Great People & Great Place to Work.

Confira a entrevista abaixo:

Nosso Meio: A saúde mental e a comunicação interna foram eleitas como as principais prioridade e como os principais desafios das empresas cearenses para 2025. Nesse contexto, quais fatores externos e internos influenciaram para que essas questões chegassem a esses patamares dentro dos ambientes de gestão das empresas alocadas no Ceará?

Daniela Diniz: Essas questões atravessam não somente as empresas cearenses, mas também as empresas brasileiras de um modo geral. Como consequência, há uma tentativa de dar foco às principais dores que afetam as organizações quando o assunto é relação com os funcionários. Em relação à saúde mental, a temática ganhou força após a pandemia, justamente porque há mais pessoas sofrendo com estresse, depressão, ansiedade e burnout atualmente. À medida que aumentam os casos, aumentam também o afastamento de profissionais.

No caso da comunicação interna, ela é, historicamente, um grande desafio das organização, mas que está se tornando mais latente atualmente. É possível ver que a sociedade está dialogando menos, mas a entrada de novas gerações, que têm outras formas de se comunicar, e os diferentes modelos de trabalho em operações estão tornando o fluxo de comunicação mais complexo.

Nosso Meio: Há uma tendência quase global de empresas regredindo em ações que beneficiem à diversidade e à inclusão dentro dos ambientes corporativos. Felizmente, o Brasil está indo na contramão desta tendência e investindo mais em ações que beneficiam minorias sociais como mulheres, população negra e membros da comunidade LGBTQIA+. No caso do Ceará, entretanto, há um dado preocupante que chama atenção: 51% das empresas cearenses não colocaram diversidade e inclusão nos seus orçamentos em 2024. Nesse caso, o que precisa ser feito para que diversidade e inclusão se tornem também uma prioridade dentro da gestão das empresas alocadas no estado?

Daniela Diniz: A liderança das organizações precisam estar engajada com esse tema e entender o impacto que a diversidade, equidade e inclusão provoca no ambiente de trabalho, no clima e na inovação. Se não houver uma conscientização da liderança da empresa sobre a importância de manter políticas e práticas de diversidade, de acompanhar indicadores e os resultados das ações, a pauta fica enfraquecida – normalmente liderada por um grupo ou uma pessoa com menor poder de influência. Sem força, esse tema perde a relevância (e o orçamento).

Nosso Meio: 55% das empresas brasileiras que participaram da pesquisa do GPTW afirmaram que há dificuldades para atender às expectativas das diferentes gerações dentro do ambiente de trabalho, principalmente as da Geração Z, no que diz respeito à comunicação. Por que os gestores das gerações passadas sentem tanta dificuldade em se comunicar com os colaboradores da geração atual?

Daniela Diniz: O “conflito de gerações” é um tema clássico do mundo corporativo. Quando a geração Y (Millenial) entrou no mercado de trabalho em meados dos anos 2000, nós vivenciamos algo parecido com o que vivenciamos atualmente. Os líderes da época (profissionais representantes das Gerações X e Baby Boomer) rotulavam aqueles jovens de “impacientes, infiéis e insubordinados”, afirmando que “eles queriam só qualidade de vida e trabalhavam pouco”.

Qualquer semelhança com o que vemos ou sentimos hoje não é coincidência. Parte da dificuldade está em entender que os jovens naturalmente chegam com uma visão diferente sobre o trabalho. Eles não têm ainda a malícia e os vícios corporativos, e também são mais ansiosos. Mas é importante ressaltar também que cada geração traz algumas características próprias do seu contexto de vida.

A Geração Z é a primeira geração que chamamos de nativa digital – ou seja, aprendeu o alfabeto num tablet -, e esse traço impacta a forma como esses jovens se comunicam, trazendo uma complexidade maior de diálogo (não é à toa que comunicação foi apontada como o maior desafio das organizações no relatório). É preciso entender essas diferenças e, depois de entender essas diferenças, é preciso aceitar e aprender com elas Sempre foi assim ao longo da história do trabalho. O preconceito e os rótulos só atrapalham mais essa relação e as formas de comunicação.

Nosso Meio: 44% das pessoas responderam que o ESG é uma pauta estratégica. Entretanto, 58% das empresas não têm orçamento dedicado ao ESG, sendo que 29% das empresas não têm, mas pretendem investir na área; enquanto 28% afirmam não ter orçamento, nem a intenção de investir nisso em 2025. Com o consumidor, a cada dia, mais consciente, é possível dizer que essa realidade tenda a mudar nos próximos anos?

Daniela Diniz: Sim, acreditamos nessa mudança. Percebemos que o que falta mais nas empresas é entendimento sobre a pauta ESG. Falta maturidade e o entendimento que essa agenda é de responsabilidade de todas as empresas, não importa o seu tamanho, setor ou localidade. Todas as questões relacionadas a essa agenda já afetam a nossa sociedade – como bem colocado, o consumidor mais consciente já faz suas escolhas com base nessas políticas.

Nosso Meio: No caso das empresas catarinenses, cearenses, baianas e do Distrito Federal, 97% vão investir em novas lideranças neste ano. No caso do Ceará, um líder que resolve problemas está dentro do perfil almejado pelas organizações.  Indo além dessa habilidade, que outras estão sendo buscadas na hora de se investir em novos líderes?

Daniela Diniz: As outras habilidades esperadas para um líder transitar bem no ambiente corporativo são: empatia e gestão humanizada; conhecimento do negócio/produto ou do serviço (precisa dominar o seu segmento); resiliência e adaptação às mudanças; alinhamento com a estratégia e comunicação. Ou seja, é uma mescla entre as chamadas hard skills (competências mais técnicas) e soft skills (competências comportamentais).

Nosso Meio: No Ceará, o índice de organizações que adotam inteligência artificial em suas rotinas de trabalho é de 40%, um percentual baixo comparado a estados como Santa Cantarina, onde a IA tem espaço em 77% das corporações. Existe alguma resistência das empresas alocadas no Ceará que dificulta a entrada da inteligência artificial em suas rotinas?

Daniela Diniz: De fato, o uso da Inteligência Artificial no Ceará se apresentou como um dos mais baixos no nosso relatório. O estado ficou à frente apenas da Bahia (33%), do Amazonas (32%) e do Maranhão (43%).

Na nossa análise, empresas que fazem o pouco uso de IA são aquelas que demonstram ainda menos conhecimento sobre a ferramenta, desconhecendo, portanto, o seu alcance e impacto nas atividades. Uma outra hipótese, mas que colocaria em outro lugar – não como principal – é uma possível resistência ao uso das novas tecnologias. Algo que também se mostra bastante natural na história do trabalho. 

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