Aila Sampaio, Martonio Mont’alverne, Humberto Cunha Filho e Carlos Velázquez compartilham detalhes dos processos criativos das palavras escritas
O Dia Nacional do Escritor homenageia escritoras e escritores brasileiros. Este dia foi determinado desde 1960, quando o ex-ministro da Educação e Cultura, Pedro Paulo Penido escolheu a data para a realização do I Festival do Escritor Brasileiro. Desde então, a data é a oportunidade perfeita para celebrar os grandes talentos brasileiros no mundo literário.
A professora dos cursos de Cinema e Jornalismo na Universidade de Fortaleza (Unifor), Aila Sampaio, já produziu o total de 7 obras literárias . Suas palavras falam sobre o sentir, resgatando leitores que se identificam com o seu olhar sensível para a vida.
“Como os meus livros falam de amor, de perdas, questões existenciais, da fragilidade humana e do tempo fugidio, muitos leitores se identificam, sentem-se contemplados… Recebo muito esse retorno, sobretudo nas redes sociais, e vejo que o que escrevo tem a ver com quem é sensível, em quem vive em carne viva como eu”, compartilha.
Refletindo sobre o poder da palavra, Aila aos 10 anos teve a oportunidade de se apaixonar pela leitura ao se deslumbrar com a ‘Antologia dos Poetas Brasileiros’, organizada por Manuel Bandeira. Após isso, o amor e envolvimento pelas palavras escritas foram crescentes.
“Depois veio Dom Casmurro, que li aos 13. Daí mergulhei no universo de Drummond, Clarice, Lygia… e, nos últimos tempos, Milton Hatoum. Recomendo a leitura de todos os livros dele”, conta.
Consciente do poder da palavra, Aila ressalta que a mesma carrega consigo a capacidade de ferir ou curar.
“A palavra pode ferir ou curar. Pode ser bico de faca amolada ou unguento, tem uma potência infinita. Ela tem a força que dermos a ela, de acordo com as potencialidades expressivas escolhidas”, ressalta.
Entendendo a importância da produção de trabalhos científicos, Martonio Mont’Alverne, professor de direito da Unifor, enfatiza que os artigos e livros acadêmicos são fundamentais para a explicação de problemas vivenciados diariamente. Martonio é o único cearense citado no ranking dos cem mais citados professores de Direito da América Latina. O professor produziu 4 livros científicos que colocam a discussão de pautas do Direito em evidência.
“O trabalho que tive mais prazer em produzir até agora, foi a minha tese de doutorado. Elaborei, apresentei e defendi na Universidade de Frankfurt. Foi um trabalho que eu me dediquei bastante e portanto me deu o enorme prazer em pesquisar sobre o papel do Poder Judiciário na formação do Estado Brasileiro”, revela.
Além disso, Martonio ressalta que o propósito da leitura, tanto literária como acadêmica, é sempre o mesmo, fazer o indivíduo refletir.
“A boa literatura sempre traz advertências e sempre nos provoca incômodos, porque ela nos obriga a refletir sobre aquilo que a gente acreditava tradicionalmente e somos submetidos a crítica. Na minha avaliação, a manutenção da abertura do espírito crítico é o grande mérito tanto da escrita científica como da literária”, finaliza.
O professor do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Unifor, Humberto Cunha Filho é autor de 8 obras científicas que envolvem o Direito cultural. Apesar da produção voltada para o mundo acadêmico, Humberto ressalta que sua escrita ‘conversa’ com o fazer literário e conta como lidar com os diferentes momentos do processo criativo.
“Embora a minha literatura penda mais para o lado técnico-jurídico, ela flerta com o literário, e tanto de um lado como do outro, como diz Amoz Oz, o processo criativo tem altos e baixos. Para lidar com as baixas, contudo, não fico parado, faço trabalhos que demandam menos criação, como coleta de dados, leituras e elaboração dos esquemas do que será futuramente desenvolvido”, compartilha.
Além disso, Humberto faz questão de evidenciar como há propósito na escrita, afinal as palavras carregam em si a potencialidade de gerar nos indivíduos e por meio dos indivíduos profundas reflexões.
“Podemos ter uma ideia do poder da palavra pelo primeiro versículo da Bíblia: “No princípio era o verbo”. Pelo mesmo livro sagrado, notamos que Deus fez as coisas pronunciando seus nomes: “Faça-se o céu, a terra, o dia, a noite…”. Do ponto de vista literário, a palavra funda e refunda coisas, tal qual José de Alencar criou todo o imaginário sobre o Ceará, quando, a partir do romance-poema “Iracema” falou dos “verdes mares bravios da minha terra natal”. Isso também ocorre com a literatura de natureza técnica, como no caso da inserção em nossas leis da palavra “feminicídio”, que não é apenas um tipo penal, mas um brado contra a violência sobre as mulheres, que passou a engajar pessoas e instituições nesta causa”, finaliza Humberto.
Atuando como professor da Unifor nas áreas de História da Arte, Estética e Mitologia, Carlos Velázquez é autor e organizador de 8 publicações de livros e artigos científicos, mas também ficcionais de índole infanto-juvenil, assim como partituras musicais. Vivenciando o processo criativo em diferentes cenários, Carlos faz questão de relatar que cada processo tem suas peculiaridades.
“Há ocasiões em que uma ideia se impõe e vai direto para o papel quase como um ditado, depois disso vem um trabalho minucioso de refinamento… outras vezes a ideia parece muito clara na cabeça, mas se resiste a ir para o papel… não sei… é sempre diferente”, conta.
Sobre a escrita de contos infantis, Carlos compartilha que em alguns momentos pode ser angustiadamente difícil.
“Pode parecer estranho, mas a escrita de contos infantis, apesar de ser muito divertida, em alguns momentos se torna angustiantemente difícil; ela exige um exercício de superação de preconceitos e verticalidades adultas indispensável para evitar o “falar pequeno”, o “tom professoral” e, sobretudo, conseguir uma boa dinâmica entre os meandros do “politicamente correto”. Pense num desafio!”, fala.
Entendendo o valor da leitura, Carlos enfatiza que atualmente a melhor indicação é puramente a leitura em si.
“Creio que o mais honesto seria indicar a leitura. Isso mesmo, a leitura compulsiva é indiscriminada. Eu leio de tudo e leio sempre, e todas as leituras mexem comigo. Sabe? As pessoas de hoje apreciam muito os aparelhos interativos, mas poucos se dão conta de que a vida mesma (e digo “mesma” no sentido de essência) é pura interatividade. A rigor, não precisaríamos de interatividades artificiais porque temos a vida!”, finaliza.
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