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Eleições 2022 sem fake news: profissionais em marketing político do Nordeste explicam como fazer uma estratégia digital limpa

Por Redação

25/01/2022 11h29

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Os experientes profissionais em marketing político Renato Ribeiro e Dácio Azevedo compartilham suas percepções e pontos de atenção para a comunicação das campanhas

O ano de 2022 mal começou e nas redes sociais só se fala nisso: as eleições. No dia 2 de outubro, os brasileiros vão escolher presidente, governador, senadores e deputados e até lá, um bombardeio de conteúdos sobre partidos e candidatos serão consumidos, especialmente, no ambiente digital. Sabemos que nem toda informação é confiável e vivemos sob uma verdadeira pandemia de fake news. Dois profissionais de ampla experiência em marketing político no Nordeste compartilharam com o Nosso Meio as suas estratégias digitais para criar uma campanha limpa nas redes sociais. Conheça o método de trabalho e as análises de Renato Ribeiro (Bolero Comunicação – CE) e Dácio Azevedo (Art&C Comunicação Integrada – RN)

 

O publicitário e mestre em Comunicação Renato Ribeiro tem longa trajetória como estrategista em marketing político, com 14 participações em campanhas majoritárias (prefeitos e governadores) nos estados do Ceará, Maranhão, Pará, São Paulo e Amapá. Para Renato, o primeiro passo para desenhar uma campanha é estudar o candidato. “Obviamente, nada é neutro, ainda mais uma campanha política que pode impactar a vida de milhões de pessoas. Não pode ser encarado como ‘um trabalho qualquer’. Não é necessário ter um completo alinhamento político, mas não se deve trabalhar para alguém que pensa completamente diferente de você, com um projeto político que você não acredita”, ressalta.

 

Se é possível trabalhar com o candidato, o segundo passo é montar uma equipe, formular um plano de pesquisas, tanto quantitativas (face to face, por telefone ou on-line) quanto qualitativas (grupos focais, vivência de viés etnográficos e outras metodologias que podem ser construídas). Depois, é necessário produzir um banco de dados, incluindo a compra de informações, monitoramento para basear estratégias e segmentação de públicos. Para isso, a equipe deve incluir cientistas de dados. Essa é a estrutura mínima para iniciar uma campanha eleitoral.

 

Quando o assunto é fake news, para Renato Ribeiro, a resolução 23.610 do TSE, juntamente com a resolução 23.671, que regulamenta a propaganda eleitoral das eleições em 2022, podem ser inócuas na questão de impedir ou mesmo reduzir as notícias falsas. “De fato, foram introduzidos alguns artigos mais específicos, com punições para as informações falsas, como o Art. 90. e Art. 93-A. Mas qual a definição de notícias falsas?”, questiona a amplitude do conceito.

 

Dácio Azevedo tem 27 anos de experiência em comunicação, atendendo especialmente clientes governamentais e agentes políticos. Já contribuiu com 15 campanhas eleitorais nos Estados de Mato Grosso, Rio Grande do Norte e Maceió para cargos nas prefeituras de municípios, governos estaduais e senado. O profissional destaca que a adesão às mídias sociais foi a grande transformação que possibilitou uma nova forma de comunicar política nos últimos tempos. “Se antes fazíamos um trabalho de preparação para a chegada do horário político no rádio e na TV, hoje o trabalho começa bem cedo, com a construção de uma presença forte nas redes sociais e a produção de muito conteúdo para consolidar a pré-candidatura de forma planejada. A internet trouxe a possibilidade de segmentar a mensagem, falar a pessoas de perfis distintos, com necessidades específicas. Isso possibilitou aos candidatos a oportunidade de se comunicar de maneira muito mais próxima e efetiva, com a mensuração de resultados em tempo real”, ressalta Dácio.

 

Dácio Azevedo ainda faz uma análise crítica sobre a produção de marketing eleitoral no Rio Grande do Norte, onde atua hoje profissionalmente. Para o jornalista e redator de campanhas, o Estado já teve um trabalho de marketing político forte e inovador, com profissionais que se destacaram e ganharam projeção nacional, mas essa efervescência estaria esquecida. “Não há nada de novo e interessante na produção local. Talvez seja reflexo do próprio ambiente político, que segue estagnado e à mercê de velhas figuras da oligarquia potiguar. Aqui, o sobrenome político continua sendo uma moeda de troca forte para quem se aventura na política – mesmo que o candidato não tenha propostas e conhecimento. Esse marasmo acaba por contaminar o trabalho do marketing político. Não se pode vender algo novo se esse novo não existe”, destaca o especialista que enfatiza que a comunicação é apenas uma ferramenta que ajudará o candidato a vencer as eleições. “Não vendemos fórmula mágica, bala de prata ou realizamos milagres. Um candidato ruim e indisciplinado, que resolve fazer tudo pela sua cabeça e não dá ouvidos a quem cuida da sua comunicação pode terminar o processo eleitoral menor do que entrou”, enfatiza.

 

Do outro lado, tem todo um trabalho de mobilização e de costura política. No desenho da comunicação da campanha, algo fundamental é ter um trabalho integrado de todas as mídias, para que o eleitor se identifique com o programa do candidato na TV e encontre eco às suas propostas na Internet. Mais do que nunca, é necessário oferecer uma experiência completa às pessoas. 

 

Construção da fake news

 

A fake news é construída com a intencionalidade de convencer, por isso, incorpora elementos da realidade, fatos concretos, com alguma mentira. Já no início de 2022 temos um exemplo claro. Uma criança teve um mal súbito, cerca de doze horas depois de tomar a vacina contra a COVID-19. Posteriormente, houve o esclarecimento de que o ocorrido estava relacionado a uma doença pré-existente. A história foi a oportunidade perfeita para grupos antivacina usarem isso ao seu favor.

 

Para apoiar a versão, até mesmo o Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e a ministra Damares Alves, foram visitar a criança. O presidente Bolsonaro telefonou para a família da suposta vítima da vacinação. Renato Ribeiro relembra que “depois, o Ministério da Saúde reconheceu que o evento adverso não teve relação com a vacina. Mas isso não foi disseminado no ecossistema de comunicação. O que ficou como verdade é que a criança teve uma parada cardíaca depois de tomar a vacina. Então, como controlar isso na prática?”, questiona o especialista que acrescenta criticamente: “Combater fake news é algo bem complexo e não podemos nos balizar pelas resoluções do TSE, que são válidas somente no período eleitoral. Antes e depois desse intervalo de tempo também são importantes. Temos que pensar dentro de uma lógica de redução de danos. O acesso amplo à internet e à informação, sem restrições, precisa entrar nesse debate das fake news, junto com educação midiática, desde cedo nas escolas”, finaliza.

 

As resoluções do TSE são importantes suportes aos departamentos jurídicos das campanhas. A assessoria jurídica trabalha em harmonia com a comunicação política, que por sua vez, deve estar sempre atualizada sobre a legislação para defender o candidato ou partido das fake news. De acordo com Dácio Azevedo, o profissional de marketing sabe quando o adversário passa do ponto e comete crime eleitoral, seja na pré-campanha, no horário eleitoral ou na postagem da internet. “Cabe a cada um estar atento e denunciar, através da assessoria jurídica do candidato, os desvios do opositor. Por sua vez, é fundamental ter o conhecimento pleno da Lei e ser muito bem assessorado por um jurídico experiente e atuante”, complementa.

 

Sobre o uso de fake news em campanhas eleitorais, os dois especialistas são bem enfáticos: não participam nem compactuam com a postura adotada por alguns profissionais de marketing que sujam a reputação de um segmento extremamente importante, comprometido e sério. Produzir informação falsa é crime e não deve fazer parte da estratégia de nenhuma campanha política. 

 

Combate à desinformação

 

Desde dezembro de 2021, postagens sobre as Eleições 2022 que forem publicadas no Facebook e no Instagram, pertencentes à empresa Meta, passam a ser marcadas com um aviso sobre o assunto. Sempre que os sistemas das duas redes sociais identificarem o tema, um cartão com links para o Portal da Justiça Eleitoral será exibido. A iniciativa faz parte da parceria do Facebook e do Instagram com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no combate à desinformação, e visa proteger o processo democrático e ajudar as pessoas a terem acesso a informações confiáveis. Um recurso parecido já é utilizado quando o post aborda a pandemia de Covid-19.

 

O Brasil é o primeiro país a receber esses avisos, conhecidos como rótulos. O objetivo é ajudar na propagação de informações oficiais sobre o sistema de votação, além de colaborar para rebater as fake news sobre o processo eleitoral no pleito do ano que vem. A novidade faz parte dos investimentos em políticas e ferramentas para combater a desinformação nos processos eleitorais em todo o mundo. Nas Eleições Municipais de 2020, foram removidas mais de 140 mil peças de conteúdo do Facebook e do Instagram no Brasil pela violação das políticas de interferência na votação antes do primeiro turno do pleito.

 

Quanto ao Telegram, uma parte do Ministério Público Federal (MPF) quer proibir a propaganda eleitoral no aplicativo de mensagem neste ano de eleições. A avaliação dos procuradores é de que a plataforma não pode servir de palanque virtual para divulgar fake news. O Telegram apresenta regras menos rígidas do que as redes sociais concorrentes, podendo ter grupos com até 200 mil pessoas. Por esse motivo, o aplicativo se tornou um meio de propagação de inúmeras notícias falsas, além de discursos de ódio. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), juíz Luís Roberto Barroso, já entrou em contato com o fundador da rede para pedir cooperação no combate à propagação de fake news nas eleições de 2022.

 

*Com informações do TSE e EBC