2ª Edição-Brasília

Entrevista | Comunicação estratégica é conexão com múltiplos públicos

Por Redação

03/06/2025 12h00

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Com 30 anos de experiência na comunicação pública e corporativa, Fábio Santos é CEO da CDN Comunicação e presidente do Conselho Gestor da Abracom. Jornalista de formação, construiu uma trajetória marcada pela atuação em contextos de alta pressão e pela defesa de uma comunicação estratégica baseada em escuta, relacionamento e construção de narrativas com múltiplos públicos. Sua carreira foi desenvolvida principalmente em São Paulo, onde está localizada a sede da CDN e onde permanece sua base até hoje, embora atue em projetos em Brasília e mantenha visitas frequentes à capital federal. Nesta entrevista, compartilha os aprendizados que conectam comunicação, política e reputação.

NOSSO MEIO | Embora sua base seja em São Paulo, você mantém uma atuação constante em Brasília, um dos ambientes mais complexos e estratégicos do país. O que essa vivência na capital federal tem te ensinado sobre o poder da comunicação em contextos de alta pressão e múltiplos interesses?

Fábio Santos: Brasília, de fato, é um ambiente desafiador. O que mais me impressiona é que por aqui se encontram alguns dos melhores profissionais do país. Outro aspecto é que também há muitos stakeholders relevantes concentrados num pequeno espaço geográfico, o que gera muitas oportunidades de relacionamento, mas você nunca está sozinho para aproveitá-las, há sempre um competidor por perto. 

NOSSO MEIO | Ao longo da sua carreira, você passou de repórter a CEO e presidente de entidade setorial. Quais princípios de liderança te acompanharam nessa jornada e ainda orientam suas decisões hoje?

Fábio Santos: Se há algo que me acompanha ao longo da carreira em todas as funções que ocupei é a disposição para me relacionar de maneira positiva com as pessoas com as quais convivi ou convivo profissionalmente. Creio que dessa característica decorre uma outra desenvolvida nos cargos de liderança, a capacidade de trabalhar com as equipes que encontro nos locais por onde passei. Claro que é sempre importante ter um núcleo de confiança, mas não necessariamente ele deve ou pode ser formado por pessoas novas. É preciso construir aliados entre os que já estão e desenvolver confiança mútua, pois o custo de trocar pessoas é sempre alto para os dois lados.

NOSSO MEIO | Um estudo da Abracom mostra que, embora diversidade e inclusão sejam vistas como relevantes por 74% das agências, as ações concretas têm diminuído. O que falta para transformar esse discurso em prática efetiva no setor?

Fábio Santos: Esse é um tema complexo, que envolve muitos desafios, que não são exclusivos do setor de comunicação. A escassez de mão de obra de qualidade é um deles, não apenas em relação a populações minoritárias e/ou socialmente excluídas. Qualquer dirigente de agência de comunicação vai mencionar que uma de suas maiores dificuldades é contratar pessoas. Faltam bons profissionais de todos os tipos, o setor tem se tornado menos atraente ao longo dos anos. O que já é difícil mostra-se ainda mais desafiador quando tentamos agregar inclusão e diversidades às contratações, uma vez que as pessoas de grupos historicamente prejudicados tendem a ter menor acesso a educação e formação. Mas é possível ampliar a diversidade da força de trabalho das agências, o que vem acontecendo, por meio da ação consciente da liderança. Falta velocidade nesse processo, porém, o que só vai acontecer por meio de uma maior igualdade em toda a sociedade.

NOSSO MEIO | Em tempos de transformações tão rápidas, como a comunicação corporativa pode se manter estratégica sem perder a agilidade?

Fábio Santos: Não vejo uma contradição entre ser estratégico e ser ágil. A agilidade é um componente essencial de uma comunicação estratégica num tempo em que a velocidade de produção e consumo de informação é estonteante. O desafio para as agências e profissionais de comunicação corporativa é outro: enfrentar o conceito equivocado de que, já que somos todos mídia e todos podemos produzir e divulgar conteúdo, não é mais necessário ter relacionamento com diversos canais de comunicação, basta ter uma base ampla de seguidores nas redes sociais. Há dois erros fundamentais nessa ideia. A primeira é que a comunicação direta via redes só pode ser uma estratégia prioritária para determinadas empresas e alguns poucos líderes empresariais. A segunda, mais relevante, é que, mesmo que você seja competente na produção de conteúdo e na sua divulgação para uma base relevante, o que torna a comunicação positiva para construção de uma reputação sólida e duradoura é o diálogo com diversos stakeholders: imprensa, governos ou órgãos reguladores, empresas e entidades do setor em que se atua, usuários de redes sociais que não são seguidores de seu perfil, a comunidade imediatamente impactada pelo seu negócio, a sociedade em geral. Para ter um diálogo relevante, é preciso se abrir para o outro, entendê-lo, estabelecer um relacionamento, é aqui que a comunicação corporativa profissional pode ajudar. Esses profissionais são capazes de fazer as conexões entre as empresas e os interesses e demandas desses vários stakeholders.

NOSSO MEIO | Você costuma dizer que é apaixonado por construir narrativas convincentes em meio a contextos desafiadores. Qual foi o momento mais marcante em que a força da narrativa fez a diferença em uma situação complexa?

Fábio Santos: Difícil definir apenas um momento, mas posso citar um que marcou por ter sido a minha estreia em gestão de crises de imagem na comunicação corporativa. Em 2013, eu havia acabado de assumir a direção da conta da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, pela CDN, quando as manifestações do movimento Passe Livre explodiram na capital paulista, sendo depois acompanhadas por diversos outros movimentos, alguns inclusive antagônicos entre si. Apesar de as manifestações já estarem acontecendo, foi a repressão da Polícia Militar a uma manifestação do dia 13 de junho o estopim para explosão que viria. Naquele momento, surgiram as táticas dos black blocs, levando a PM a mais confrontos com manifestantes e desgastes para a instituição e para o governo, diante da exposição dos atos de policiais nas redes sociais. Para enfrentar essa situação, em conjunto com a comunicação da PM, desenvolvemos a estratégia de também registrar o lado da polícia, mostrando como, muitas vezes, os policiais estavam reagindo a violências praticadas pelos manifestantes. A PM passou a utilizar cinegrafistas e fotógrafos que produziam conteúdos divulgados na imprensa e nas redes. Essa estratégia conseguiu mostrar que determinados protestos ou grupos de manifestantes investiam no conflito com a polícia como forma de ação política.