Estética, ética e lógica a partir do rebranding da Jaguar

Por Redação

04/12/2024 09h26

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Por Silvio Koiti Sato

O recente rebranding pelo qual passou a marca de automóveis Jaguar foi muito comentado nas redes sociais e na mídia de forma geral, engajando anônimos, influenciadores e especialistas os mais diversos, que criticaram, elogiaram ou midiatizaram a polêmica, gerando buzz e interesse pelo assunto. Um ponto comum que se destacou na discussão coletiva foi a sensação de “confusão” que a ação da marca trouxe para boa parte do público.

O filme de lançamento da marca pode ajudar a compreender essa dificuldade de compreensão. Com uma atmosfera semelhante a um ensaio de moda, a nova marca surge na porta de um elevador que se abre para a saída de modelos que representam diferentes corpos, etnias, gênero e faixas etárias, vestidos com figurinos em cores quentes, vibrantes e luminosas. Eles desfilam e posam num cenário árido, enquanto letterings (delete ordinary ou copy nothing, por exemplo) se sucedem, com mensagens imperativas pouco específicas, que poderiam ser utilizadas por muitas outras marcas, e de inúmeros setores.

Ou seja, não há qualquer indício sobre qual produto está sendo anunciado, algo expresso por Elon Musk em post que foi fartamente compartilhado: “Vocês vendem carros?”. Da mesma maneira, a relação entre marca Jaguar e o “mundo” apresentado no filme não é explicitada. Isto porque não há elementos que representem as associações identitárias centrais dessa marca conhecida e quase centenária (automóvel de luxo, design e performance, por exemplo), isto sem mencionar signos distintivos da marca, como a figura do animal que remete ao seu nome.

Neste sentido, há problemas na articulação entre a estética e a ética da marca, uma ligação quase imediata, pensando na semiótica peirceana. A nova identidade visual e estilo de comunicação, que compõe sua dimensão estética (relacionada às sensorialidades e sensibilidades da marca) trazem novos signos que não parecem levar a uma dimensão ética coerente, com valores e crenças refletidas em suas ações e estratégias concretas. O novo foco da marca na plataforma de veículos elétricos e novos públicos ainda carece de entregas efetivas, que possam aproximar-se dos potenciais significados trazidos pela nova marca. De acordo com os executivos da Jaguar, desdobramentos da nova estratégia da marca serão conhecidos em breve, o que pode garantir novas discussões coletivas nas redes.

Por enquanto, podemos dizer que num mundo estetizado, midiatizado e afoito por discussões rápidas e julgamentos instantâneos, é preciso combinar ética e estética para que seja possível uma perspectiva lógica que leve em conta as atitudes e os comportamentos que a marca é capaz de promover (ou não) em seus públicos. E isto ocorre a partir de sua atuação junto a um homo estético, numa relação cada vez mais social, cultural, cocriada e que muitas vezes leva a algum grau de (des)controle que precisa ser levado em consideração pelos gestores da empresa.

Sobre o autor:

Doutor e mestre em Ciências da Comunicação pela ECA USP. Publicitário formado pela ESPM. Pesquisador junto ao GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo – ECA USP. Professor ESPM e da FAAP. Sócio fundador da Casa Semio.

Clotilde Perez
Professora universitária, pesquisadora e consultora
Clotilde Perez é professora universitária, pesquisadora, consultora e colunista brasileira, titular de semiótica e publicidade da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo, concentrando seus estudos nas áreas da semiótica, comunicação, consumo e sociedade contemporânea. Fundadora da Casa Semio, primeiro e único instituto de pesquisa de mercado voltado à semiótica no Brasil, já tendo prestado consultoria nessa área para grandes empresas nacionais e internacionais, conjugando o pensamento científico às práticas de mercado. Apresenta palestras e seminários no Brasil e no mundo sobre semiótica, suas aplicações no mercado e diversos recortes temáticos em uma perspectiva latino-americana e brasileira em diálogo com os grandes movimentos globais.