Encerro meus seis meses como estrangeiro nos Balcãs com uma cena familiar: dois peregrini em um laboratório de UX.
– Quem são os usuários? – Impera a questão no ofício do UX.
– O que eles querem comigo? – Perturba-se o ator-usuário convidado para uma pesquisa.
O Planejamento de UX reclamado nestas croniquetas pressupõe que a pessoa pesquisadora e o ator-usuário estejam no centro das decisões dos negócios de produto. Quando estão face a face nos oito estádios do Planejamento Estratégico de UX, ambos tornam-se figuras em um estranhamento. O que digo é:
O investigador, ao examinar o fenômeno onde o stranger (ator-usuário) habita, está interessado em entender a relação entre o indivíduo e o grupo social que ele tenta se integrar ou compreender no império das features do negócio. A tese que sustento permeia-se em torno da condição do estranho como alguém que, embora integrante do grupo de maneira singular, mantém-se à margem de uma plena assimilação – situando-se o utilizador próximo o bastante para interagir, mas preservando uma distância que lhe veda a completa incorporação.
Ora, torna-se imperativo que nos dois estádios iniciais do Planejamento de UX (Contextualização e Objetivo) essa tensão de se buscar compreender o outro seja colocada.
A Contextualização consiste em compreender os cenários nos quais os usuários se inserem e as premissas que orientam as decisões da firma. Para isso, torna-se mister examinar de que maneira o contexto dos usuários é mapeado e quais pressupostos sustentam essa construção. Algumas questões-chaves auxiliam nesse processo:
- • O que se mapeou enquanto contexto do ator-usuário?
- • Quais pressupostos foram levados em consideração?
- • Como esses cenários influenciam decisões estratégicas?
Revelar os códigos de interesse de se decifrar os cenários do ator-usuário é prioritário. Destarte, a determinação de objetivos assume papel fundamental na articulação entre UX Research e as diretrizes do negócio. Isso implica compreender as razões que motivam a formulação dos objetivos estratégicos no contexto da pesquisa, avaliar de que maneira essas diretrizes impactam as decisões de produto e verificar se há um alinhamento efetivo entre UX Research e as metas corporativas. Para tanto, algumas perguntas são fundamentais:
- • Quais os motivos subjacentes aos objetivos estratégicos traçados no caso de UX Research?
- • Como esses objetivos impactam as decisões de produto?
- • Há alinhamento entre UX Research e as metas da empresa?
A intenção de sustentar o Planejamento de UX não se constitui apenas como um processo metodológico. Trata-se de um locus no qual a relação entre o pesquisador e o ator-usuário se inscreve em sua dimensão de estranhamento. De um lado, na Contextualização, evidencia-se o interesse pelo ator-usuário; de outro, os Objetivos delineiam-se enquanto chave de negócio para conduzir a intenção da pesquisa à sua finalidade última. Ao longo dos estádios iniciais, a necessidade de compreender o outro impõe-se como uma conditio sine qua non, uma tensão estruturante que deve ser absorvida não apenas como princípio investigativo, mas como eixo orientador das decisões estratégicas.
O fenômeno do estranho é estudado por Alfred Schutz sob a óptica da interpretação da cultura do grupo pelo indivíduo. A pessoas investigadora precisa compreender o “padrão cultural” do coletivo e encontrar seu lugar dentro dele, mesmo que essa posição nunca é totalmente estável.
O imigrante é tomado como o exemplo mais evidente desse fenômeno. O conceito de estranho, sem nenhum embargo, se aplica também a outras figuras sociais, como novos membros de instituições e aprendizes que entram em círculos sociais fechados. Aqui, defendo que o mesmo ocorre com os atores-usuários de features.
O investigador de UX, praticando o Planejamento que tenho proposto, deve se interessar não apenas pelo processo de assimilação e ajuste social, mas pelo próprio ato de aproximação. Firmemente creio que esta abordagem sugere que a visão do mundo do indivíduo não seja homogênea. Sobretudo deve ser crida como estratificada em diferentes camadas de relevância, onde certos elementos são mais importantes do que outros, dependendo de seus objetivos e interesses. O conhecimento que o ator-usuário estranho busca não é absoluto, mas graduado e correlacionado com suas necessidades práticas.
Dessa forma, a consideração da estranheza do UX se insere na análise mais ampla das interações sociais e da construção do conhecimento dentro de um coletivos. Revela-se nos dois estádios iniciais do Planejamento de UX. Mostrando como as relações sociais são estruturadas, como o pertencimento e a exclusão operam, e como a identidade do indivíduo se forma em meio a essas dinâmicas.
Finalizo defendendo que ao desvendar os códigos que decifram os cenários do ator-usuário e ao estabelecer objetivos que interligam UX Research às diretrizes do negócio, o planejamento transcende a mera análise, assumindo um papel ativo na figuração da empatia ao desconhecido. Ao entendimento do Outro estrangeiro e no firmar chaves de intencionalidades para um pesquisa concretamente relevante para quem a concebe.