Como a pesquisa se reinventa para dar voz ao que não se vê, mas se sente
Em um mundo de mudanças exponenciais, sejam elas tecnológicas, ambientais ou sociais, a pesquisa tradicional, baseada em dados pretéritos, já não é suficiente. Se os dados passados são, para alguns especialistas, uma “autópsia” do que já aconteceu, o mercado atual exige que as metodologias se reinventem para capturar o que ainda é latente: desejos, emoções e os sinais emergentes do futuro.
A reinvenção da pesquisa passa, obrigatoriamente, por complementar o quantitativo (o tamanho do fenômeno) com o qualitativo (o porquê e o como dos comportamentos). É neste ponto que o cool hunting, metodologia que analisa as tendências, se torna crucial. De acordo com Sabina Deweik, especialista em cool hunting, o estudo busca capturar sinais emergentes para prever desejos e mudanças de valores. Isso é feito através de uma observação 360 graus que abrange vários setores. A especialista reforça que a pesquisa não pode ser apenas métrica; ela precisa da subjetividade, intuição e do poder de observação.
Deweik detalha ainda que a metodologia exige a análise do Zeitgeist, também chamado de o “espírito do tempo”, através de quatro P’s do Society (People, Places, Plans e Projects), que cobrem desde o comportamento social até os projetos que mudam a relação com o nosso entorno. Para Sabina, o cool hunting é capaz de ir além da resposta do consumidor, que muitas vezes nem sabe o que quer. “O ‘cool hunting’ é capaz de capturar, mais do que uma métrica, mais do que uma resposta do consumidor. Ele é capaz de capturar a alma do nosso tempo”, defende.
“Olhando para esses quatro P’s, a gente consegue dar conta 360 graus de novos comportamentos, de capturar novos sinais e para isso, a gente precisa de percepções, a gente precisa de subjetividade, a gente precisa de observação, precisa ter uma certa sensibilidade para poder juntar todos esses sinais, interpretar. Porque a pesquisa, ela é interpretativa também e a interpretação tem a ver com o humano, não tem a ver só com uma métrica tecnológica”, explica Sabina Deweik.
Mapeamento
Na visão de João Paulo, Chief Executive Officer na 2Mobile, pesquisas qualitativas e exploratórias são essenciais porque “tentam criar uma análise de linguagem ao que ainda é difuso”, revelando desejos e valores que não aparecem nos dados transacionais. “Ao mergulhar no contexto de uso, rituais e símbolos locais, os dados mapeiam o ‘objetivo’ emocional para gerar hipóteses da validação quantitativa. Isso é uma tentativa de reduzir a miopia de decisões baseadas somente em volume e média”, explica João Paulo.
O especialista ainda detalha que, para captar essas nuances, são necessárias entrevistas com profundidade em contexto real, netnografia com análise de discurso, combinadas com técnicas projetivas. Além disso, “a jornada emocional também é muito importante, sempre considerando os valores regionais de cada público. A combinação de várias técnicas é uma espécie de UX na qual você monta um dashboard para cada perfil”.
Nesse contexto e aplicando à prática, João Paulo destaca um case acerca de um projeto realizado para o Governo do Mato Grosso do Sul, onde a pesquisa identificou quais veículos de comunicação eram responsáveis por mensagens mais assertivas para com o público. “O estudo mostrou claramente os veículos que possuem maior afinidade com a comunicação desejada pelo anunciante, exibindo a publicidade digital para quem estava disposto a receber aquela informação. Isso foi muito importante, pois a exposição aos anúncios está cada vez mais alta e o impacto está cada vez maior. A partir do nosso relatório de pós- venda, foi possível identificar a quantidade de acessos reais e qualitativos em cada veículo de comunicação”, apontou João Paulo.
Em concordância, Sabina Deweik destaca que por trás desses dados existe um comportamento. “A ideia é que a gente possa interpretar, e aí é que vem, talvez, a fase mais difícil, que é interpretar esses indicativos, entender o que eles estão falando sobre o nosso tempo para que a gente possa, a partir daí, pensar em novos cenários estratégicos”, conclui Deweik.
