Prazos mais curtos, alto volume de demandas e inteligência artificial são fatores que afetam o trabalho dos profissionais que atuam nos setores criativos
As redes sociais mudaram o jeito de consumir publicidade, apresentando novas dinâmicas e desafios para as agências. Os anúncios publicitários, por sua vez, ficaram mais curtos, priorizando uma mensagem mais simples e direta, com roteiros menos elaborados do que os apresentados nas décadas passadas. Nesse contexto, a criatividade é colocada em xeque e a dúvida surge: será que a publicidade brasileira ainda é criativa?
Diretora da agência Acesso Criação, Ana Celina Bueno acredita que a publicidade brasileira não está menos criativa. Para ela, o dilema atual que as agências vivenciam resume-se em duas palavras: volume e velocidade. “O tempo é um fator importante para o processo criativo e, hoje, tudo é urgente e em grande volume. Isso na maioria das vezes compromete o processo criativo”, ela explica.
Dados recentes publicados pelo Data & Marketing Association (DMA) apontam que um anúncio publicitário menos criativo tem 43% menos chance de ser lembrado pelo público. As investigações ainda dizem que campanhas que despertam os sentidos tendem a ter maior êxito em gerar impacto. Trabalhando como redator publicitário na agência EBMQUINTTO, o jovem Metusael Sousa compartilha da ideia que a criatividade é essencial para criar memórias. Entretanto, ele aponta que outro elemento também é fundamental para marcar a audiência e se conectar com ela: a representatividade.
“Ver um anúncio e se enxergar nele cria uma conexão emocional no espectador que, na minha visão, cumpre ainda mais o objetivo buscado pela publicidade”, pontua.
Além do tempo mais curto e do volume maior de demandas, outro fator dos tempos modernos vem transformando o mercado publicitário: a inteligência artificial. Softwares mais recentes estão tomando decisões semelhantes às humanas em diferentes ocasiões e situações, mudando as dinâmicas de trabalho nas agências e gerando debates. Entre as questões em voga, a substituição de profissionais é uma preocupação que aflige 55% dos profissionais de comunicação entrevistados pela agência MarketCross.
O publicitário Felipe “Femo” Carvalho e Caio César, entretanto, vão na contramão da ideia de substituição de profissionais e se alinham com quem acredita que a IA não será protagonista dos setores criativos, mas uma aliada. Para eles, as ferramentas de IA não são capazes de captar e reproduzir as nuances que só seres humanos dominam em aspectos emocionais, culturais e de humor.
“Vejo a IA como uma ferramenta muito bacana para ajudar a somar para melhoria de certas etapas, inclusive ajudando criativamente em frentes mais técnicas. Até o momento, não a enxergo como uma grande “vilã” para os criativos. Essas ferramentas podem até ajudar a criar uma tendência menos criativa com o tempo, mas vai depender muito da forma que a gente vai administrar esse poder em nossas mãos”, afirma Femo.
“Acredito que, em alguns aspectos, a inteligência artificial pode tornar o trabalho mais automático e levar a uma preguiça criativa. No entanto, eu também vejo a IA como uma ferramenta poderosa para auxiliar e otimizar os processos de trabalho, sem substituir a originalidade e as sensibilidades humanas. É fundamental valorizar os profissionais que trabalham com criatividade, pois são eles que trazem a visão, a empatia e a autenticidade indispensáveis para criar conexões reais”, complementa Caio César.
A criatividade ainda é um elemento indispensável para a publicidade e desempenha um papel crucial para gerar conexões entre marcas e audiências. É ela quem acompanha a ideia desde sua concepção, passando pelo briefing, reunião de planejamento, produção da peça e o momento em que ela vai ao ar. Em resumo, a criatividade é o combustível que faz a roda da publicidade girar.
“O criativo sempre será a principal matéria-prima de uma agência, mas não dá para considerar como criativo somente o diretor de arte ou o redator. O time (atendimento, planner, mídia e produção) precisa ser igualmente criativo para que no processo de criação essa multidisciplinaridade faça a diferença na estratégia e no conteúdo”, aponta Ana Celina.