Influência

O papel do professor no inédito contexto social e a sua contribuição para o mercado da comunicação

Por Redação

15/10/2021 14h42

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Com o novo contexto social do mundo, um dos setores que se refizeram e se fizeram foi a educação. O sistema de ensino superior no Brasil tinha como base o modelo de ensino presencial, e teve que se adequar – dentro de um curto período de tempo – ao ensino à distância.

Antes do fenômeno da pandemia acontecer, implantar o método de ensino híbrido já era ideia das universidades, mas isso aconteceria de forma gradual e sem muita pressa. Porém, pelas circunstâncias impostas pela pandemia, os planos relativos a isto foram antecipados e executados.

Assim,  há de se convir que essas mudanças, inevitavelmente, impactaram os alunos, os professores, e a sociedade como um todo. É sobre isso que o Nosso Meio falou com alguns professores universitários. Sobre essas diversas alterações que aconteceram e continuam a acontecer em tão curto espaço de tempo.

Todos os nossos entrevistados, mesmo se utilizando de abordagens diferentes para explicar como foram impactados por esse verdadeiro fenômeno que é a crise sanitária mundial, chegaram a uma conclusão só: o formato ideal de ensino para as instituições de ensino superior é o formato híbrido.

 

O Nosso Meio conversou com esses professores também sobre a evolução do mercado de comunicação cearense, sobre como a docência forma talentos e sobre como eles contribuem, de forma prática, para essa formação e para o desenvolvimento do mercado.

 

A professora Denise Maciel, que atualmente é Reitora da Unifametro e Professora do Curso de Comunicação, acredita que o ensino se torna mais versátil e dinâmico ao se utilizar o sistema híbrido, aliando atividades presenciais e remotas, tanto síncronas como assíncronas. Assim, as aulas  devem ser mais curtas e centradas na experiência de aprendizado do aluno.

“A ênfase do ensino para aprendizado do aluno deve estar voltada para o “”aprender a aprender””, para o incentivo da inovação, para o empreendedorismo, e para o pleno desenvolvimento das suas capacidades. Deve haver uma maior interação entre mercado e academia/escola/faculdade. O mercado deve estar aberto às  novas ideias e contribuições desses talentos.”

Denise disse que, como gestora e professora, ela procura fomentar uma mentalidade de união e de valorização de todos os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, sejam eles colaboradores, estudantes ou professores.

 

Para o professor Carlos Bittencourt, professor do Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade de Fortaleza, nestes dois anos de transformações no mundo “foram incorporados os recursos e as possibilidades referentes ao ensino remoto no nosso portfólio de professores. Vivenciei algumas experiências interessantes como, por exemplo, levar para a sala de aula profissionais que estavam do outro lado do mundo. Isso, de outra maneira, não seria possível. No entanto, acredito que haverá um desejo muito grande de retorno à presencialidade. Devemos lembrar que um curso superior é bem mais que aulas ministradas. É um espaço de socialização, convívio, trocas muito mais intensas que o Meet e suas “bolinhas com letras iniciais ou avatares” podem oferecer. Acredito que o modelo híbrido veio para ficar, mas o contato humano vai permanecer.”

“Embora a comunicação seja um fenômeno globalizado e suas regras, de certa maneira, pautadas por essa internacionalização, estamos vivendo um globalismo cultural. Interessará ao mundo aquilo que é representativo da realidade e da cultura de um determinado local. Compreender e difundir essa realidade, muitas vezes, é papel da sociedade local.”

“Poucos são os alunos que buscam grupos de pesquisa ou procuram participar de encontros nacionais de comunicação inscrevendo artigos, trabalhos e produtos. Aos cursos superiores, falta enxergar o jornalismo para além da redação clássica. Temos a comunicação empresarial que é um vasto campo a ser explorado, por exemplo. O jornalismo de dados ainda é pouco explorado, também. A Universidade de Fortaleza é uma das poucas no Brasil que oferece um núcleo com esta perspectiva.”

No que se refere a contribuição como professor para o mercado da comunicação, Bittencourt atua conectado com as transformações que a tecnologia tem proporcionado.

“Sou pesquisar do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Comunicação Empresarial – NEPCE –  do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza. Nele, atuamos no jornalismo com conceitos mais modernos, como por exemplo, Inteligência Artificial, Aprendizado de Máquina, Processamento de Linguagem Natura, Big Data, Small Data. Enfim, trabalhamos com conjunto de dados para compreender a realidade que nos cerca. Obviamente, esse trabalho não fica restrito ao NEPCE. Além de ser levado para as salas de aula, abrimos vagas para que os estudantes possam se engajar como estagiários. Aí, obviamente, ele passa a compreender o alcance que a ciência de dados pode proporcionar aos processos comunicacionais. Procuro estar, permanentemente, conectado com as transformações e leva-las para as salas de aula. Ouço os alunos para assim realizarmos trocas de conhecimentos. A sala de aula é um espaço de encontro de gerações e, obviamente, de experiências. Trocar conhecimentos é a única maneira de promovermos transformações.”

 

A professora Kátia Patrocínio, professora de Rádiojornalismo e de Mídias Sonoras nos Cursos de Jornalismo e de Publicidade e Propaganda, cita o período da pandemia como sendo um momento crucial para o uso do aparato tecnológico que temos disponível. E fala do ensino a distância como uma opção, porém ela defende o ensino presencial, e acredita que ele deva prevalecer, já que o contato e a aproximação das pessoas por meio do molde presencial faz parte do papel das universidades.

“Quando há aproximação entre as pessoas, elas se conhecem melhor e produzem melhor e chegam melhor ao mercado. Durante a pandemia eu tive a oportunidade de ter contato direto com alguns alunos durante uma semana, e na semana seguinte – quando as aulas foram a distância – eu sabia quem eram aqueles alunos com quem eu tinha tido contato na semana anterior. Eu não vi apenas fotos de perfis e pessoas por meio de vídeos. Esse contato acaba por ser muito importante nesse momento quando a maioria das pessoas acha que a tecnologia é tudo. Nós temos que lembrar que quem faz a tecnologia somos nós, os seres humanos.”

O momento em que estamos vivendo deve ser traduzido como o que “olha para as pessoas”, e, por isso, é preciso “fazer uma publicidade” que conheça e reconheça os valores que temos hoje em discussão. Atualmente a informação não deve ser só uma mercadoria simplesmente, mas sim deve ser vista como algo que muda a sociedade e valoriza comportamentos que estejam conectados com valores éticos. A universidade não tem que trabalhar da mesma forma que o mercado trabalha, mas ela tem que dar possibilidades e condições para que o estudante, quando vá pro mercado, ele saiba lidar com os possíveis desafios.

“É preciso que o professor trabalhe no intuito de esclarecer o aluno em relação ao que ele vai encontrar quando sair da universidade. Eu vejo a universidade como sendo o espaço em que nós podemos inovar e experimentar coisas diferentes, e o mercado não é bem assim, já que ele tem interesses capitalistas muito mais fortes.”

Dominar a tecnologia, as técnicas, operacionalizar os meios não é o mais difícil. O mais complexo é o que se propaga por meio deles, e esse é o grande diferencial.

“Eu ensino disciplinas práticas. Ensino Rádiojornalismo e Mídias Sonoras, e por meio delas eu tento fazer os alunos compreenderem que para a gente fazer uma reportagem bem feita, a gente precisa ter um bom conteúdo. Eu trago nas minhas aulas temas como: qual é o papel de uma rádio educativa, como uma rádio educativa pode contribuir na formação do cidadão, e como ela pode formar cidadãos mais conscientes e críticos em relação a ele ser sujeito dentro da sociedade. Acho que a minha contribuição se dá nesse sentido: ensinar como uma reportagem deve ser bem feita, sobre como deve acontecer a parte técnica, mas, principalmente, como você vai levar o conteúdo para o ouvinte.

 

O professor Jari Vieira, que ensina Fotografia, Fotopublicitária, Fotojornalismo, e Mídias Sociais, acredita que o processo de ensino está em constante mudança e evolução. E que a metodologia de ensino não mudou, só se atualizou. O que mudou na verdade foi a forma a partir da qual se passou a ver o EAD, especificamente no que se refere a aulas  síncronas e assíncronas. Porém, Jari, acredita que a presença e o “olho no olho” fazem a diferença. Nada se compara a experiência presencial que se pode ter.

“A universidade ajuda a revelar e a potencializar talentos para que eles possam se diferencializar dentro do mercado cerense. E para que estes talentos não ganhem outros mercados, o que é preciso na realidade é cada vez mais valoriza-los. E eu acho que isso tem acontecido. Valorizar no sentido de contratar os profissionais e premia-los.”

Em relação aos cursos de comunicação, Jari disse que os alunos saem muito bem preparados. Que em 19 anos de profissão, vê ex-alunos brilhando no mercado, o que retrata isso. O que é confirmado a partir das premiações recebidas por profissionais do estado cearense.

“Eu sou de Juazeiro do Norte, sempre falo de onde eu vim, e o quanto sou apaixonado pelo Cariri. Moro em Fortaleza desde criança, mas constantemente estou repetindo o quanto é importante a gente valorizar aquilo que é nosso, o quanto é relevante as pessoas valorizarem o lugar de onde elas vieram. Nisso se inclui a sua família e as suas origens. É isso é o que eu passo para o meus alunos sempre. Além disso, desenvolvo projetos de extensão nas faculdades nas quais eu leciono que consistem em viagens com os alunos para lugares aqui no Ceará ou do Nordeste para que eles conheçam as culturas destes. Faco isso no intuito de que quando esses alunos estiverem no mercado de trabalho e forem criar algo, o que venha primeiro em suas mentes seja o que é nosso. Para que se olhe internamente e se valorize nossa riqueza.”

 

Wagner Borges, professor na área de Comunicação e Coordenador do Curso de Jornalismo da Universidade de Fortaleza, afirma que, apesar da pandemia ter sido um fenômeno vantajoso para algumas empresas, sobretudo as de comunicação.

Para o coordenador, de uma forma geral, o ensino superior privado brasileiro respondeu bem à adequações necessárias. “As inadequações se deram muito mais por questões culturais e financeiras do que pela questão tecnológica. A inédita aplicação destes modelos de ensino gerou um sentimento de ansiedade, já que nada substitui o talento, nada substitui o professor. Então, baseado nas experiências vistas nos estados brasileiros a tendência é que se adote uma metodologia híbrida onde o professor continue a ser o facilitador, mediador de conteúdos, principalmente, em relação àqueles que precisam de aplicabilidade prática e presencial. Relativo ao contexto teórico, o ensino híbrido propõe que o aluno pesquise e estude mais ao considerar que o professor é responsável por facilitar, mediar e materializar as soluções para os questionamentos que surgirem (como já era antes da pandemia). Eu acredito que em 2022 haverá um casamento da tecnologia no dia a dia dos alunos sem relevar o papel insubstituível do professor.”

Sobre os talentos da comunicação e o mercado cearense, Wagner Borges, pôde falar sobre a sua própria experiência que se deu, também, no suldeste.

“Eu aprendi muito cedo que talento não é uma coisa regional, apesar do protagonismo e da condição social econômica serem bem importantes. E esse tipo de pensamento baseado na ideia de que a construção de talentos está ligada à regionalidade é algo que deve ser excluído por completo, já que essa visão não é especificamente do profissional, essa ideia vem do mercado empresarial cearense, com excelentes excessões claro, que tem essa visão periférica de que o profissional que trabalha no sul ou no suldeste do Brasil é mais capacitado, articulado. Essa teoria “cai por terra” porque, além da tecnologia e da modernização da economia, o nosso mercado de comunicação reflete uma série de práticas que não deixam a gente a dever nada em relação ao sul e suldeste. Digo, com muita alegria, inclusive, que o mercado de comunicação cearense tem características regionais que superam outros mercados.”

O Ceará tem grandes talentos trabalhando fora do estado, atuando de forma muito relevante. Porém a ideia de que profissionais talentosos não formam sua carreira profissional dentro do Ceará é algo que deve ser, de uma vez por todas, destruída, acrescentou Wagner.

“O caminho para acabar com essa ideia é bem longo ainda já que nós temos algumas culturas administrativas que consideram que quem trabalha ou estuda fora do Ceará é melhor do que quem trabalha e estuda aqui. Isso já tendia a mudar e essa tendencia só se fortificou devido a crise sanitária pela qual estamos passando. A exclusão de pensamentos que remontam a ideia citada está se dando em meio a possibilidade existente sobre a troca de informações de forma imediata e instantânea em função das práticas remotas que demonstram a nossa capacidade de engajamento e de liderança no sentido de formar nosso próprio mercado.”

“Como gestor eu percebo, há bastante tempo, o fato de que os cursos de comunicação no Brasil refletem um modelo muito atrelado ao ensino das Universidades públicas, que são excelentes claro, mas que ainda têm uma série de amarras no sentido de discutir de forma mais crítica, e mais democrática o espaço de fala de cada um. É necessário acabar com a dicotomia de que curso de comunicação de universidades públicas falam mal dos cursos de comunicação das universidades privadas, ao passo que os professores e gestores das universidades privadas falam bem dos cursos das universidades públicas. Diante disso, se vê uma necessidade de se quebrar barreiras físicas e, principalmente, barreiras mentais que demonstram preconceitos que ainda continuam a existir na cabeça dos profissionais da educação. Essa quebra não se dá de uma hora para outra pois estes pensamentos fazem parte de um modelo mental, cultural, periférico, politico e ideologico, que de certa forma está ligado a uma série de modelos de negócios que já estão ultrapassados.”

Ou seja, faltam mudanças que para acontecerem é preciso que sejam deixados para trás modelos antigos, e se considerar o que se tem internamente. É o famoso “olhar pra dentro” e entender que nada precisa estar, necessariamente, atrelado a um modelo vitorioso. É vital propor e se utilizar de novas técnicas, novas propostas, novos modelos e possibilidades. Mas o que falta para que isso aconteça?

O professor Wagner expõe que costuma dizer que “se tem um slogan parecido com o que eu penso em relação ao mercado de comunicação, ao mercado de jornalismo e ao mercado de educação superior de comunicação é que a gente tem sempre que buscar a certeza de que tá certo mesmo quando a gente tá na contramão. Os paradigmas existem para que sejam entendidos, desmitficados, mas também quebrados. Sempre valorizo o diálogo. A gente dialoga, mas no final sempre questiono sobre o que podemos fazer de inédito a partir das ideias geradas nesses diálogos. A acomodação limita as possibilidade de mercado. E considerando que os alunos chegam até nós munidos de sentimentos inovadores, renovados, tonificados, querendo novos desafios, nós professores, não podemos oferecer apenas o que está atrelado à tradição.”