Análise

O que Solange Duprat nos ensina sobre equilíbrio entre trabalho e vida pessoal

Por Lucas Abreu

30/04/2025 10h00

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Nesta matéria especial do Dia do Trabalhador, discutimos sobre a importância da produtividade sustentável para a saúde e bem-estar dos trabalhadores

Quem assiste à TV Globo na faixa das 21h, depara-se com as múltiplas tramas que ocorrem simultaneamente em Vale Tudo. A protagonista de uma delas é uma jovem bonita, inteligente e estilosa, que usa uma tiara vermelha e uma franja ruiva. Seu nome é Solange Duprat e ela é diretora de criação da fictícia agência Tomorrow Lab.

A personagem interpretada por Alice Wegmann chama atenção pela elegância e pelo seu magnético carisma. Entretanto, um peculiaridade sua virou cerne de discussões em redes sociais como o Instagram e o X: a dedicação excessiva ao trabalho. Alguns usuários desejam ter a vida de Solange, justificando seus excessos pela vida luxuosa que ela leva. Já outros, apontam a rotina a qual a personagem se submete como problemática, exaustiva e comprometedora de sua saúde física e mental, como também de suas relações pessoais.

Essas discussões sobre Solange Duprat não estão distantes das conversas feitas por especialistas sobre a importância de se equilibrar o trabalho com a vida pessoal. Atualmente, as corporações brasileiras enfrentam uma crise de saúde mental, que afeta diretamente a rotina seus colaboradores. Segundo dados do Ministério da Previdência, o número de afastamentos em 2024 foi de quase meio milhão, o maior em 10 anos e um aumento de 68% em relação ao mesmo período em 2023.

“Já tive burnout e precisei me afastar por um tempo do mercado. Isso afetou não só a minha carreira, como também meus relacionamentos e minha família. Busquei ajuda, fiz terapia, tratamento medicamentoso por um bom tempo até retornar de fato ao mercado. Mesmo após o retorno, se readaptar foi complicado”, relata o profissional de marketing Fabrício Brito. Atualmente, ele tenta levar uma vida mais equilibrada em relação ao seu trabalho por meio de terapia e com uma agenda bem definida.

Estudos como o da Organização Mundial da Saúde já apontam que custo global de transtornos mentais em produtividade e cuidados médicos já ultrapassa US$ 1 trilhão por ano. No Brasil, a estimativa é que as doenças mentais causem perdas de quase R$ 400 bilhões anuais em produtividade, afastamentos e rotatividade de funcionários.

“O corpo começa a acionar os sinais através de incômodos físicos, com dores, cansaço extremo, insônia, irritabilidade, crises de ansiedade, falta de concentração, dentre outros sintomas. Ninguém consegue viver com o acelerador pressionado o tempo todo. Quando a mente cansa, o corpo adoece e a vida perde o sabor”, explica Elaine de Tomy, psicanalista e vice-presidente do Instituto Revoar. “A empresa precisa incentivar o equilíbrio, oferecer suporte psicológico, revisar as metas e valorizar o humano, não só o resultado. Um colaborador saudável produz mais, e mais do que isso, ele vive melhor. Então todos são beneficiados com uma cultura organizacional favorável para os dois lados”, complementa.

Para contornar a crise, o Governo Federal anunciou que a inclusão dos riscos psicossociais na Norma Regulamentadora Nº1 (NR-1), que estabelece as diretrizes de saúde mental no trabalho. A medida entrará em vigor apenas em caráter educativo e orientativo a partir do dia 26 de maio. Com essa decisão, a aplicação de multas por descumprimento será adiada para maio de 2026.

“A inclusão dos riscos psicossociais na NR-1 é um passo muito importante porque reconhece, de forma oficial, que o bem-estar emocional e social das pessoas faz parte da saúde no ambiente de trabalho. É um avanço necessário e sensível, pois reforça que o trabalho deve ser um espaço seguro também do ponto de vista mental. Quando cuidamos das emoções, prevenimos adoecimentos silenciosos e promovemos ambientes mais humanos e produtivos”, afirma Kássia Sales, presidente da ABRH-CE.

No ano passado, durante a 10ª Reunião Extraordinária, a Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP) determinou a atualização do Capítulo 1.5 da NR-1, o que significa a inserção dos riscos psicossociais como estresse, assédio, carga mental, a uma demanda de segurança e saúde no trabalho. Na prática, as empresas terão que adotar medidas de prevenção, realizar avaliações contínuas e estratégias para evitar que esses problemas ocorram no ambiente de trabalho. 

A aplicação primária em caráter educativo ocorreu após diálogo entre o Ministério do Trabalho e Emprego e representantes das bancadas de trabalhadores e empregadores, que solicitaram mais tempo para se adequar a todas as modificações necessárias para a atualização. O governo também anunciou a criação de uma Comissão Nacional Tripartite Temática, que contará com a participação de representantes do governo, das entidades sindicais e do setor empresarial para acompanhar o processo de implementação da norma.

“Estamos seguindo com várias discussões e esse início em caráter educativo é uma forma generosa e consciente de permitir que as empresas se adaptem, aprendam e se sensibilizem para o tema, sem o peso da obrigatoriedade imediata. Na prática, significa que agora é o momento de dialogar, capacitar lideranças, revisar processos e criar um ambiente aberto para escuta e acolhimento”, finaliza, Kássia Sales.