Outro destaque da linguagem visual cearense que o Nosso Meio trouxe para você conhecer é a jornalista Domitila Andrade, que tem a tirinha semanal “Mulher Listrada” (@mulherlistrada) no caderno Vida & Arte do Jornal O Povo. Arte, consciência política, femino e humanização: esse é o universo da nossa terceira convidada da série Trajetória em Traços.
Domitila atua como jornalista e realiza eventuais trabalhos de ilustração para o jornal O Povo, além da tirinha semanal no caderno Vida & Arte com a personagem Mulher Listrada. O alter-ego narra vivências e sentimentos da jornalista, mas também trata de assuntos que tangem o factual – as queimadas na Amazônia, o óleo nos mares do Nordeste, a luta de uma criança vítima de violência para fazer um aborto. “Acho que ela é um pouco mais aberta e transparente do que eu. É como se eu a usasse para que fosse a minha voz. E como tal ela nem sempre é engraçada, divertida – ainda que tenha seus momentos. Muitas vezes, ela trata de assuntos que me afligem naquele instante”, explica.
Domitila autodenomina-se “analógica”, não aderindo à tendência da ilustração digital. Para ela, o processo criativo cercado de papel e tinta proporciona muito mais prazer ao trabalho. “Tento falar de coisas que vivo e é muito bom quando é publicado e quando posto e vejo que mais um monte de gente está passando pelo mesmo. É um sentimento de acolhida. Ao passo que eu sinto que não estou só, há outra pessoa que lê a Mulher Listrada e se vê nela, se reconhece, sente o mesmo que eu. Recebo muitas mensagens de mulheres, principalmente, que me agradecem por compartilhar”, conta a artista.
Com mais de uma década dedicada ao Jornalismo, Domitila percebe a ilustração indo bem além da arte. “É suporte e pode ser entendida também como ferramenta de comunicação. Ela completa o sentido, auxilia na mensagem, atrai o leitor. Não é meramente ‘para deixar bonito’. Hoje, os ilustradores que trabalham no jornal ou que fazem trabalhos de ilustração eventuais, como é o meu caso, trabalham diretamente com os diagramadores, pensam na composição das páginas, impressas ou online, produzem elementos para os infográficos e, claro, pensam as ilustrações a partir das matérias de forma a serem mais um elemento de leitura e comunicação”, ressalta a criativa.
Ser uma jovem mulher no universo da ilustração também se apresenta como um desafio. Domitila explica: “Já tive que escutar muito conselho não solicitado de ilustrador homem – e veja que não é uma questão de não ouvir as experiências dos outros, claro que a troca é sempre bem-vinda, mas é de ouvir pitaco no seu trabalho que só te coloca para baixo, sem qualquer intenção construtiva. Já escutei até que tinha conseguido um freela concorrido porque os contratantes estavam procurando uma mulher, mais que ilustrações. Mas, ao mesmo tempo que essa é uma parte da história, a outra é imensamente gratificante; ser mulher me faz chegar a outras mulheres, tocá-las com as minhas experiências e visões de mundo que são tão delas também; e, assim, me perceber como parte de uma comunidade. As ilustrações me fazem compreender a sororidade na prática”, destaca a artista.
Domitila elenca três dicas para quem deseja trilhar os rumos da ilustração: “Primeiro, pratique. Quem quer seguir com a ilustração como profissão não pode nunca deixar de praticar. A segunda dica é ler e consumir outros artistas. Estar atento ao que acontece no mundo, as discussões, e consumir música, filmes, séries e outros ilustradores vai permitir que você tenha repertório. Por fim, a terceira dica é ser autêntico”, finaliza.