Recentemente, para comemorar seu 160º aniversário, a Perrier, marca francesa de água, apresentou uma edição limitada de sua conhecida garrafa, assinada pelo designer Philippe Starck. A nova garrafa é apresentada no site oficial da empresa como “um verdadeiro objeto de arte […], o formato emblemático do frasco foi elevado com finas listras horizontais que coreografam a óptica e a luz, produzindo um efeito luminoso que combina perfeitamente com a energia ilimitada e a poesia capturadas em seu interior”.
Sobre esta transformação na garrafa da Perrier, lembramos que a embalagem de um produto possui duas funções: uma de ordem prática e outra promocional. A primeira função é proteger o conteúdo, ou seja, acondicionar algo de forma segura, sem riscos de quebras ou danos até a chegada ao usuário final, pensando em todas as etapas de transporte e distribuição. A segunda, que nos interessa particularmente ao refletir sobre a parceria Perrier-Starck, está relacionada à persuasão, ou seja, a embalagem deve atrair o possível consumidor ao ser exibida numa prateleira ou numa vitrine, chamando a atenção em meio a vários outros concorrentes.
Neste sentido, além de diferenciar seu produto e atrair consumidores no ponto de venda, é importante destacar a promessa da marca de incorporar novos estímulos sensoriais a partir do tato e da visão, que se combinariam ao gosto no momento de sorver o líquido contido no frasco. Com isso, a embalagem, considerada tradicionalmente uma barreira de proteção entre o produto (conteúdo) e o usuário, torna-se ela mesma “o” objeto de desejo a ser consumido, num mundo esteticamente configurado, parte do chamado capitalismo artista, como o denomina o filósofo Gilles Lipovetsky.
Ou seja, ocorre uma alteração de lógicas anteriormente consagradas não só em relação a uma embalagem, mas sobre o processo de estetização de um produto que parece o mais simples possível: a água. Elemento natural de sobrevivência humana, é símbolo de vida, essencialidade, e de uma necessidade fisiológica básica. Entretanto, ao notar a quantidade de marcas de água existentes no mercado, das mais variadas marcas, sabores, embalagens, materiais e preços, chegamos à conclusão de que há muito mais envolvido no seu consumo e, principalmente, nos significados associados a esta categoria.
Concluímos que a estética por si tornou-se um objeto de consumo, incorporando-se a categorias antes compreendidas como indiferenciadas, “comoditizadas” e funcionais, e que agora precisam evoluir e propor experiências sensoriais mais complexas, a exemplo do que ocorre com uma marca centenária como a Perrier.
Sobre o autor:
Silvio Koiti Sato
Pesquisador-Doutor e Sócio-fundador da Casa Semio, possui experiência como executivo das áreas de Branding, Comunicação e Marketing, com passagens profissionais por agências e anunciantes.