CHAT GPT: a publicidade em boas mãos?

Por Clotilde Perez

22/02/2023 11h00

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Ao redigir o texto, pensando em escrever sobre o Chat Gpt, pensei antes em solicitar pelo chat.openai.com um slogan para o nossomeio. Pronta e imediatamente veio a resposta: “Descubra o meio perfeito para você: Nossomeio

 

Não é talvez o melhor e mais criativo slogan, mas cumpre um papel publicitário com presteza.

 

O Chat Gpt tem sido motivo de textos e mais textos em que a palavra ‘proibição’ tem assumido o controle dos sentidos contrários à inteligência artificial. As críticas surgem de escolas e universidades ameaçando banir o uso do robô à preocupação de escritores, publicitários e todos aqueles que acreditam ter o poder exclusivo da comunicação e do saber.

 

Inevitável pensar nas definições do que é conhecimento ou do que resulta saber alguma coisa. De Sócrates do ‘sei que nada sei’ ao semiologista Barthes com um saber que deve ser ‘deleite’, que deve ter ‘sabor’ e que, acertadamente, não deve ter ‘poder’, a pergunta que corre mundo é: o que é inteligência? Difícil dizer já que, mais do que acumular conhecimento, inteligência tem em sua raiz a chave de seu contexto: fazer interligações.

 

Eis uma questão que se faz à inteligência artificial. Robôs sabem fazer interligações? A julgar pelos exemplos da ficção fílmica de Blade Runner ou de AI, é possível pensar nessa inteligência que de fato transpira interligações. Falamos de ficção científica, mas no mundo dos estudiosos da IA desde Turing aos semioticistas como Lucia Santaella e Dora Kaufman, o que se vê como resposta sempre esbarra em IA é: ‘ciência e a engenharia de criar máquinas que tenham funções exercidas pelo cérebro dos animais’ (KAUFMAN,2019, p20).

 

Se essa definição de IA é levada como base, então, sim, o Chat Gpt é uma IA, um robô que, munido de dados, aponta respostas a várias questões. Não há quem não tenha testado o robô com provas do ENEM, de concursos e outras. Até onde se sabe, o Chat tem gabaritado as provas. Difícil dizer que seres humanos que gabaritam essas provas sejam capazes de fazer interligações ou apenas sejam capazes de somar informações estudadas e tê-las prontas para avaliações.

 

Inteligência também toma cores adjetivadas para que seja compreendida: emocional, relacional, libidinal (GIMENES, 2022). De certa forma, então, a inteligência artificial é um adjetivo e que nos leva a questionar o que é artificial ou natural. Discussão enorme.

 

O que se pode afirmar com Santaella (TRANSOBJETO, 31-01-23) é que a ‘IA veio para ficar e o Chat Gpt não veio para brincar’.

 

Por que seria diferente na publicidade? Robotizia e a mais recente Clarice Escritora são versões do Chat que usam o mesmo algoritmo. No artigo para a Folha de São Paulo, de Pedro Teixeira (FOLHA, Mercado, A18. 4/2/23), gente da área está dizendo que esses robôs estão no mercado publicitário em que, segundo alguns, a estrutura dos textos é mais simples. Não diria que esses sejam textos simples. A comparação vem de estruturas das narrativas literárias. A da publicidade é mais concisa e precisa ser precisa na linguagem criativa. Não tão simples assim. Se voltarmos ao slogan proposto pelo ChatGpt o que temos?

 

O verbo no imperativo implicando o comando da ação, o uso do termo ‘meio’ de forma polissêmica justamente para levar à ideia da revista nossomeio em que a palavra retoma o consagrado ‘o meio é a mensagem’, de McLuhan. Cabe descobrir o suporte exato para sua mensagem, sua comunicação. O robô parece ter estudado com o livro O slogan, de Olivier Reboul, exatamente como provavelmente ainda fazem estudantes da publicidade.

 

Embora tentada a pedir ao Chat um texto, apenas me atrevi a perguntar se o robô substituiria publicitários. Mais uma vez, delicadamente, imagino, o Chat respondeu:

 

“Não, o ChatGPT não irá substituir publicitários. O ChatGPT é apenas uma ferramenta tecnológica que pode ser usada por publicitários para ajudá-los em suas tarefas, como gerar ideias de campanhas, criar conteúdo, entre outros. No entanto, o trabalho humano é importante para interpretar nuances sociais e emocionais, fazer julgamentos criativos e tomar decisões estratégicas. Portanto, a tecnologia como o ChatGPT pode complementar o trabalho dos publicitários, mas não os substituirá completamente.”

 

Se o trabalho humano é importante para interpretar, voltamos à questão do que é ser inteligente: saber criar interligações. Ao menos, o robô parece considerar que essa é a diferença que fazemos. E ele reitera o que alguns estudiosos da IA afirmam, IA é ferramenta tecnológica.

 

Mas humanos gostam de provocar também. Para testar o robô mais uma vez, repeti a solicitação para que o Chat fizesse mais um slogan para a revista. Pronta – e nova – resposta:

 

Descubra o melhor de você no meio de tudo.

 

A chave do slogan – embora com uma frase diferente – permanece: é conciso e contém o termo ‘meio’, com o imperativo ‘descubra’.

 

Para ter a certeza de que o robô sabe o que é um slogan, fiz a pergunta e vejam só:

 

Um slogan é uma frase curta e memorável que resume a essência ou proposta de valor de uma marca, produto ou empresa. É uma forma de comunicação que busca chamar a atenção do público e transmitir de forma rápida e efetiva o que a marca representa, seus valores e sua proposta de solução para o público. Um bom slogan é memorável, fácil de entender e capaz de se conectar emocionalmente com o público-alvo.”

 

Palmas para ele? A publicidade estará em boas mãos?

 

Roseli Gimenes

Coordenadora do curso de Letras da UNIP. Coordenadora do projeto Cultura em Foco do Instituto Legus. Professora no curso Semiótica Psicanalítica PucSP. Pós doc em Comunicação e Semiótica PucSP. Doutora em Tecnologias da Inteligência e Design Digital PucSP. Mestre em Comunicação e Semiótica PucSP

Clotilde Perez
Professora universitária, pesquisadora e consultora
Clotilde Perez é professora universitária, pesquisadora, consultora e colunista brasileira, titular de semiótica e publicidade da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo, concentrando seus estudos nas áreas da semiótica, comunicação, consumo e sociedade contemporânea. Fundadora da Casa Semio, primeiro e único instituto de pesquisa de mercado voltado à semiótica no Brasil, já tendo prestado consultoria nessa área para grandes empresas nacionais e internacionais, conjugando o pensamento científico às práticas de mercado. Apresenta palestras e seminários no Brasil e no mundo sobre semiótica, suas aplicações no mercado e diversos recortes temáticos em uma perspectiva latino-americana e brasileira em diálogo com os grandes movimentos globais.